O Banco Central voltou a chamar atenção para o impacto da guerra comercial com os Estados Unidos no cenário econômico brasileiro. No comunicado divulgado após a reunião do Copom nesta quarta-feira (30), a instituição destacou que o aumento das tarifas americanas sobre produtos do Brasil amplia as incertezas externas e exige cautela na condução da política monetária. A decisão manteve a taxa Selic em 15% ao ano, movimento amplamente antecipado pelo mercado.
O tom do documento foi interpretado por analistas como prudente e, em certos trechos, levemente brando (“dovish”), já que reconhece riscos, mas evita sinalizar movimentos abruptos à frente. Logo na primeira frase, o comitê cita a piora do ambiente global provocada pela política fiscal e comercial dos EUA. O tema é retomado mais adiante, com menção direta às tarifas de 50% impostas por Donald Trump, anunciadas no mesmo dia: o BC diz estar monitorando de perto seus efeitos sobre a atividade e a inflação.
Especialistas apontam que o impacto do tarifaço pode seguir direções opostas. Para Adriana Dupita, da Bloomberg Economics, a medida tende a ter efeito desinflacionário no curto prazo, ao reduzir a atividade e aliviar pressões de demanda. Já Sergio Vale, da MB Associados, avalia que parte dos produtos que perderam competitividade externa pode ser redirecionada ao mercado interno, aumentando a oferta e ajudando a conter preços locais.
Por outro lado, o risco de retaliação brasileira preocupa. “Se o governo optar por responder na mesma moeda, o efeito pode ser inflacionário e obrigar o BC a manter juros elevados por mais tempo”, alerta Marcelo Bolzan, da The Hill Capital.
Apesar de o IPCA ainda rodar acima do centro da meta — 5,35% no acumulado de 12 meses —, cálculos apontam que o núcleo da inflação já opera em ritmo próximo a 3,6% ao ano, o que reforça o espaço para cortes graduais à frente. O BC deve detalhar suas projeções no próximo Relatório de Inflação, em setembro, quando já poderá incluir eventuais respostas do governo brasileiro às medidas dos EUA.
A mensagem do comunicado, segundo analistas, é clara: a autoridade monetária reconhece que a trajetória da Selic dependerá não apenas da inflação doméstica, mas também do desenrolar do conflito comercial, que hoje é o principal fator de incerteza no cenário econômico brasileiro.