Destaque
DestaqueEconomiaNotícias

Empréstimo bilionário aos Correios supera garantias da União em 15 anos

Com prejuízos sucessivos e risco de insolvência, os Correios buscam socorro de R$ 20 bilhões — o maior aval federal desde 2010

A tentativa do governo Lula de viabilizar um empréstimo de R$ 20 bilhões para os Correios reacendeu o debate sobre o papel do Tesouro Nacional como avalista de estatais em crise. O valor solicitado, que ainda depende da formação de um consórcio entre bancos públicos e privados, supera qualquer outra operação com garantia da União nos últimos 15 anos. O objetivo é socorrer a estatal, que acumula 12 trimestres seguidos de prejuízo e registrou perdas de R$ 4,37 bilhões apenas no primeiro semestre de 2025.

O financiamento, ainda em negociação, conta com resistência de instituições como Caixa e Banco do Brasil, que exigem a apresentação de um plano sólido de recuperação antes de avançar. O Ministério da Fazenda também acompanha com cautela, diante do risco fiscal embutido na operação. Segundo o ex-secretário de Fazenda de São Paulo e economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, o empréstimo não resolve o problema estrutural dos Correios e pode recair sobre o Tesouro se a estatal não conseguir honrar os pagamentos.

Para demonstrar capacidade de pagamento, os Correios prometem apresentar um plano de reestruturação que inclui cortes de custos e um programa de demissão de funcionários. Caso a empresa não cumpra as metas, o Tesouro Nacional — que avaliza o crédito — teria de arcar com a dívida. A operação ainda precisará passar por uma série de análises, desde a avaliação de limites fiscais até pareceres da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, antes de receber o aval definitivo da União.

Especialistas alertam, porém, que a estatal já opera em situação de dependência financeira do governo. “Os Correios têm resultados negativos desde 2022 e não têm recursos para pagar a folha. Portanto, deveriam ser classificados como dependentes e integrados ao orçamento federal”, afirma Tiago Sbardelotto, auditor licenciado do Tesouro e economista da XP Investimentos. Ele considera a operação de alto risco e defende uma avaliação independente sobre a viabilidade da recuperação proposta.

Atualmente, os Correios são enquadrados como uma estatal “não dependente” de recursos do Tesouro. Essa classificação permite que solicitem crédito com garantia da União, algo que seria vetado a empresas dependentes. É justamente essa brecha que causa controvérsia: na prática, a estatal só mantém suas operações com apoio indireto do governo federal.

O histórico mostra que nenhuma operação de crédito com garantia da União alcançou cifras tão altas. Entre 2010 e 2025, o Tesouro Nacional avalizou 767 empréstimos internos e 407 externos para estados, municípios e estatais. A maior operação interna foi de R$ 5,9 bilhões — um financiamento do BNDES à Caixa Econômica Federal para o PAC e o Minha Casa, Minha Vida em 2010. No caso das estatais, o recorde até então pertencia à Eletrobras, que recebeu R$ 12,8 bilhões entre 2013 e 2014. Nos governos estaduais, Minas Gerais lidera tanto nas operações internas quanto externas, com valores de R$ 3,7 bilhões e US$ 1,3 bilhão, respectivamente.

Com o pedido dos Correios, o governo se vê diante de um dilema fiscal e político: negar o aval pode acelerar a crise da estatal; concedê-lo pode criar precedente para outras empresas públicas em dificuldade. Tesouro, Fazenda e Correios não comentaram oficialmente o caso, segundo o levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, que compilou os dados junto à Secretaria do Tesouro Nacional.

Postagens relacionadas

1 of 519