Uma investigação sigilosa da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) levantou pela primeira vez a suspeita de crimes financeiros envolvendo a gestão do Banco Master. O relatório técnico indica que a instituição teria realizado aportes bilionários em empresas sem capacidade econômica real de retorno, inflando artificialmente seu patrimônio e comprometendo a solidez da instituição.
De acordo com os documentos analisados pelo órgão regulador, o Master investiu cerca de R$ 2,1 bilhões em notas comerciais de dez empresas, entre 2022 e 2025. Muitas delas, segundo a CVM, não apresentavam estrutura ou faturamento compatível com os recursos recebidos. O caso mais emblemático envolve a Clínica Mais Médicos S.A., localizada em Contagem (MG), que registrou receita anual de apenas R$ 54 mil em 2023, mas recebeu aportes de R$ 361 milhões, todos provenientes do próprio Banco Master.
O parecer descreve que a clínica funcionava em uma sede considerada “rudimentar” e incompatível com os investimentos milionários. A sócia formal do negócio, que havia trabalhado como recepcionista e vivia em um imóvel modesto, foi apontada como laranja, segundo os auditores. Para a CVM, a operação expõe indícios de fraude, uma vez que não havia condições econômicas para justificar tais valores.
A auditoria descobriu ainda que parte desses investimentos pode ter sido direcionada a empresas ligadas à irmã de Daniel Vorcaro, dono do Master, o que aumenta as suspeitas de conflito de interesse. O relatório alerta que a prática teria resultado em um patrimônio artificialmente inflado, elevando o capital da instituição de R$ 2,3 bilhões em 2023 para R$ 4,7 bilhões em 2024.
A CVM concluiu que as operações investigadas podem caracterizar crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, conforme o artigo 4º da Lei 7.492/86, que prevê pena de três a doze anos de prisão. A Procuradoria Federal Especializada junto à autarquia também corroborou a suspeita, afirmando que existem indícios suficientes de condutas tipificadas como crime.
A investigação ganhou ainda mais relevância porque ocorre no momento em que o Banco Central avalia a proposta do Banco de Brasília (BRB) de adquirir 58% do Master em uma operação estimada em R$ 2 bilhões. A transação enfrenta questionamentos do Ministério Público do Distrito Federal e resistência dentro do próprio governo federal. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já demonstrou reservas quanto ao negócio, e há divisão entre diretores do BC sobre os riscos envolvidos.
Em resposta, o Banco Master afirmou que os aportes já foram “integralmente quitados” e que não há qualquer exposição atual relacionada a essas operações. A Clínica Mais Médicos S.A. também declarou que não possui pendências financeiras. Já a Laqus Depositária, responsável pelo registro dos títulos, disse que cumpriu todas as exigências legais e que não é responsável pelas emissões, apenas pelo depósito dos papéis.
Apesar das defesas, o relatório da CVM foi encaminhado ao Banco Central e a outros órgãos de controle, que agora devem aprofundar as investigações. O caso adiciona novos elementos ao já conturbado processo de negociação da venda do Master e lança dúvidas sobre a real solidez da instituição, que pode ter se apoiado em aportes artificiais para sustentar sua imagem no mercado.