A atividade comercial brasileira mantém um ritmo consistente de geração de empregos, mas enfrenta um gargalo crescente na contratação de profissionais para funções específicas. Segundo levantamento da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 57% das principais ocupações do setor apresentaram indícios de escassez de mão de obra em julho de 2025, o maior nível desde 2020.
Entre agosto de 2024 e julho de 2025, o comércio abriu 321,5 mil vagas formais, saldo positivo entre admissões e desligamentos. Apesar do bom desempenho, a CNC estima que seriam necessários mais 110 mil postos de trabalho para aliviar a pressão sobre os salários e equilibrar a relação entre oferta e demanda de profissionais.
O presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros, destacou a necessidade urgente de ampliar a qualificação da mão de obra. “O comércio brasileiro está diante de uma transformação profunda. Investir na formação e atualização dos trabalhadores, como o trabalho que o Senac realiza há 79 anos, é fundamental para garantir crescimento sustentável e oportunidades em novas áreas de atuação”, afirmou.
Dados da PNAD Contínua (IBGE) mostram que a taxa de desemprego recuou para 5,8% no segundo trimestre deste ano, o menor patamar da série histórica. O avanço da ocupação foi puxado principalmente pelo setor de serviços, com alta de 6,4% em transporte, armazenagem e correio, e pelo comércio, que cresceu 1,4%. Ainda assim, varejistas relatam dificuldade para preencher funções específicas, o que tem elevado os salários de admissão acima da média.
De julho de 2024 a julho de 2025, 75% das ocupações do comércio registraram avanço salarial superior à média de 5,3% do mercado formal. Para Fabio Bentes, economista-chefe da CNC, o descompasso reflete as novas exigências do setor. “O comércio tem se mostrado dinâmico na geração de empregos, mas a escassez de profissionais em áreas como logística e estocagem evidencia um desafio estrutural que tende a se intensificar com a expansão do e-commerce”, explica.
As mudanças de perfil do consumo, aceleradas pela pandemia e pelo crescimento expressivo do comércio eletrônico, ampliaram a demanda por funções ligadas à logística. Entre as atividades críticas, destacam-se auxiliar de logística, com alta de 22,7% na escassez, estoquista (+14,6%) e expedidor de mercadorias (+13,1%). Nos últimos cinco anos, a receita nominal do e-commerce cresceu 311%, contra 55% do comércio como um todo, segundo IBGE e MDIC, pressionando ainda mais a busca por trabalhadores especializados.
A CNC calcula que, em condições normais, cada aumento de 1 ponto percentual na ocupação do comércio reduziria os salários médios de admissão em 0,44 ponto percentual. No entanto, a falta de profissionais qualificados tem mantido a pressão sobre os rendimentos, criando dificuldades adicionais para empresas que desejam expandir. Além das funções ligadas à logística, há também carência em cargos administrativos, como assistente de escritório (6,7 mil vagas), assistente administrativo (5,2 mil), armazenistas (4,7 mil), almoxarifes (4,5 mil) e ajudantes de motorista (3,8 mil).
O quadro mostra que, apesar do crescimento consistente do setor e do desemprego em nível historicamente baixo, o comércio precisa investir em qualificação e adaptação às novas demandas, especialmente as ligadas à digitalização e ao avanço do e-commerce, para garantir competitividade e sustentabilidade no longo prazo.