Déficit das estatais brasileiras atinge maior nível
Os Correios viram seu déficit aumentar de R$ 753 milhões no primeiro semestre de 2023 para R$ 1,35 bilhão no mesmo período deste ano

O déficit das empresas estatais no Brasil atingiu R$ 7,21 bilhões entre janeiro e agosto de 2024, marcando o maior valor já registrado na série histórica, de acordo com dados do Banco Central. Deste total, R$ 3,37 bilhões são referentes às estatais federais, enquanto as estaduais apresentaram um déficit de R$ 3,85 bilhões.

Os dados do Banco Central refletem o desempenho das estatais “abaixo da linha”, considerando a variação no endividamento das companhias, um conceito distinto do que é apresentado nos balanços das empresas e nos relatórios do Tesouro, que contabilizam apenas o fluxo de entrada e saída de recursos (“acima da linha”).

Embora os números tenham chamado a atenção devido ao papel do Tesouro como garantidor final das estatais, especialistas afirmam que o déficit é composto de forma qualitativamente melhor, sendo impulsionado por investimentos em expansão e pelo pagamento de debêntures. Essas debêntures, principalmente nas empresas estaduais de saneamento, são usadas para financiar novos projetos.

Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings, observa que o déficit seria mais preocupante se fosse resultado de aumento nos gastos de custeio, como despesas com pessoal. “(O déficit) não preocupa. O que geralmente preocupa são os gastos com custeio. O que estamos vendo agora são emissões de debêntures, que viram despesas financeiras quando começam a ser pagas. Em geral, no termo de captação, o gasto tem destino”, explica.

João Pedro Leme, economista da Tendências Consultoria, compartilha dessa visão, ressaltando que a emissão de debêntures pelas estatais estaduais passa por avaliação rigorosa de agências de rating e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), sendo uma forma eficiente de captação de recursos. Ele cita como exemplo a emissão de R$ 600 milhões em debêntures pela Sanepar, empresa de saneamento do Paraná, que recebeu classificação de risco AAA pela agência Moody’s.

“Do total de recursos captados para investimentos, 46,75% serão destinados a obras de expansão e melhoria dos sistemas de abastecimento de água e 53,25% para a área de esgotamento sanitário, com expansão e melhoria dos serviços”, informou a Sanepar em nota.

No conceito utilizado pelo Banco Central, quando uma empresa emite títulos no mercado, o valor captado é registrado como um ativo, mas também como um passivo a ser pago no futuro. O déficit surge quando os pagamentos dessas dívidas começam a ser realizados, impactando o caixa da empresa. A estatística, no entanto, não inclui os resultados dos bancos públicos nem da Petrobras.

Especialistas destacam que o déficit das estatais federais é influenciado por aportes realizados entre 2013 e 2023, que, inicialmente, aumentaram o superávit ao entrarem no caixa das empresas, mas que, posteriormente, contribuíram para o déficit à medida que os recursos foram usados em investimentos.

Um exemplo foi o aporte de R$ 10 bilhões em estatais em 2019, dos quais R$ 7,5 bilhões foram destinados à Empresa Gerencial de Projetos Navais (Emgepron) para a construção de quatro fragatas da classe Tamandaré para a Marinha Brasileira. À medida que os recursos foram gastos, eles passaram a ser contabilizados como déficit.

A Emgepron informou que, de janeiro a junho de 2024, o déficit apurado foi de R$ 1,2 bilhão, principalmente devido à continuidade do cronograma de construção das fragatas e do Navio Polar. A expectativa do Tesouro Nacional é de que esse déficit alcance R$ 2,5 bilhões até o final do ano.

Outra estatal que recebeu aportes significativos foi a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBpar), criada em 2021 após a capitalização da Eletrobras. A ENBpar, responsável pela parte brasileira em Itaipu Binacional e pela operação das usinas nucleares Angra 1, Angra 2 e Angra 3, recebeu R$ 4 bilhões em 2021 e mais R$ 1,2 bilhão em 2022. A projeção do Tesouro é que a empresa encerre 2024 com um déficit de R$ 631 milhões.

Entre as empresas com resultados mais adversos, os Correios viram seu déficit aumentar de R$ 753 milhões no primeiro semestre de 2023 para R$ 1,35 bilhão no mesmo período deste ano. Já a Infraero, que havia registrado um superávit de R$ 459 milhões em 2023, passou a apresentar um déficit de R$ 106 milhões no primeiro semestre de 2024.

Apesar do aumento no déficit, analistas apontam que o foco em investimentos estruturantes e a utilização de debêntures para captação de recursos indicam um cenário de recuperação potencial para as estatais, com a expectativa de que os projetos financiados contribuam para a geração de receita futura e a melhoria dos serviços públicos.

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