Desembolso dos fundos de “private equity” caiu ao menor nível em ao menos cinco anos
A volatilidade do cenário econômico também impôs dificuldades para os fundos no momento de desinvestir

Os investimentos realizados por fundos de private equity, que adquirem participações em empresas, atingiram em 2024 o menor nível em pelo menos cinco anos, de acordo com dados da Abvcap, associação que representa esse setor, obtidos com exclusividade pelo Valor. No período, esses fundos movimentaram R$ 13,3 bilhões, representando uma queda de 44,3% em relação ao montante registrado no ano anterior. Em termos de volume de transações, houve uma retração de 16,6%, passando de 84 para 70 operações.

Entre as principais transações do ano passado, segundo a Abvcap, destacou-se a venda de usinas da EDP para a Actis, em um negócio de R$ 2,7 bilhões. Outro movimento relevante foi a aquisição da rede de restaurantes Outback Brasil pela Vinci, por R$ 1,398 bilhão. Também merece destaque o investimento minoritário da Lumina no Agibank, que movimentou R$ 400 milhões.

A volatilidade do cenário econômico também impôs dificuldades para os fundos no momento de desinvestir, ou seja, vender os ativos de suas carteiras. O levantamento aponta que os desinvestimentos somaram R$ 10,13 bilhões no ano, um recuo de 6% em relação ao já enfraquecido resultado de 2023. Sem ofertas iniciais de ações (IPO) no mercado brasileiro há mais de três anos, os fundos enfrentam desafios para concretizar suas saídas. Em comparação com 2022, a retração foi ainda mais expressiva, chegando a 35,4%.

Uma das tendências recentes desse mercado tem sido o aumento das compras de participações minoritárias nas empresas. Em 2023, esse modelo representou 24% das operações de private equity, mas em 2024 a fatia subiu para 34%. Em contrapartida, as aquisições alavancadas — aquelas realizadas com recursos tomados por empréstimo — caíram de 52% para 44%, um reflexo da elevação dos juros, que encareceu o crédito e reduziu a atratividade desse tipo de transação. A alta das taxas de financiamento tem impactado diretamente a rentabilidade das operações.

Para Priscila Rodrigues, presidente da Abvcap, a queda no volume financeiro movimentado se deve, em grande parte, ao tamanho reduzido dos cheques nas transações ao longo do ano. Segundo ela, essa tendência reflete a desvalorização dos ativos, levando muitos empresários a optarem por vender apenas uma participação minoritária em suas companhias, evitando, assim, a alienação do controle a preços considerados desfavoráveis. “Os valuations estão mais conservadores até mesmo pela referência do mercado [das empresas listadas]”, observa.

Rodrigues também destaca que os fundos seguem ativos e participando de diligências para novos investimentos. No entanto, a dificuldade de encontrar caminhos viáveis para a saída dos investimentos tem ganhado relevância nas decisões. Diante desse cenário, alguns fundos cujo prazo de encerramento se aproxima têm recorrido à extensão do período de operação, estratégia que, segundo a executiva, tem sido bem aceita por investidores mais sofisticados, que acreditam em um retorno potencialmente maior no futuro.

Carlos Eduardo Martins, responsável pela área de private equity da Vinci, avalia que a alta dos juros e as incertezas impactaram o setor globalmente, e não apenas no Brasil. No entanto, ele considera que 2024 foi um ano relevante para a alocação de capital da Vinci, que realizou três movimentações importantes, incluindo a aquisição do Outback Brasil. Além disso, a gestora captou um novo fundo ao longo do ano.

Para 2025, Martins não projeta uma recuperação expressiva da atividade, diante de um cenário ainda incerto e com juros elevados. No entanto, ele aponta que boas oportunidades estão surgindo no mercado, como a venda de ativos por estrangeiros e a necessidade de empresas alavancadas buscarem capital, seja por meio da venda de ativos ou da entrada de novos sócios para reforçar o balanço.

Henrique Muramoto, que lidera a operação brasileira da Warburg Pincus, avalia que 2024 foi um ano positivo para a gestora, com investimentos estratégicos realizados principalmente no primeiro semestre. Já na segunda metade do ano, a volatilidade aumentou. Entre os negócios fechados, estão aportes na Contabilizei (serviços de contabilidade), na Matera (tecnologia) e um novo investimento na empresa de educação Salta.

Muramoto também destaca que a volatilidade cambial tem sido um fator de preocupação para as gestoras, uma vez que o câmbio é um elemento essencial no cálculo de retorno dos fundos de private equity. Mesmo aqueles que captam recursos no Brasil frequentemente possuem uma parcela relevante do capital investido em dólar, tornando o desempenho atrelado à moeda americana.

No primeiro semestre de 2025, a Warburg Pincus pretende se concentrar na consolidação dos investimentos realizados no ano anterior, priorizando a gestão interna dos ativos.

Para Anderson Brito, chefe do banco de investimento do UBS BB, 2025 deve marcar uma recuperação gradual do setor. Segundo ele, a análise dos mandatos recebidos pelo banco indica um aumento tanto na busca por ativos para aquisição quanto na oferta de empresas à venda. Além disso, ele observa que a demanda por financiamento para fusões e aquisições está aquecida.

Brito ressalta que os fundos continuam interessados em setores nos quais o Brasil tem vantagens competitivas. Entre os segmentos mais atrativos, ele destaca o de energia limpa e mineração. Outra área de interesse são setores que se beneficiam do tamanho do mercado interno, como o de consumo. Além disso, segmentos com baixa penetração, como data centers e serviços financeiros, também devem atrair maior atenção dos investidores. (Com Valor)

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