O Senado avançou nas discussões sobre a criação de um teto para a dívida pública da União. O relator da proposta, senador Oriovisto Guimarães (PSDB-PR), anunciou que fará ajustes em seu parecer para atender a preocupações do Banco Central e do Tesouro Nacional, que temiam prejuízos à rolagem da dívida pública e às operações compromissadas da autoridade monetária.
A proposta em análise estabelece que o limite será calculado sobre a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG), mas exclui dívidas de estados e municípios, além das compromissadas do BC. Com esse recorte, a dívida bruta considerada estaria hoje em pouco mais de 60% do Produto Interno Bruto (PIB). O teto sugerido por Oriovisto é de 80% do PIB, o que daria ao governo federal um período de seis a dez anos para atingir o limite, dependendo do crescimento da economia.
Caso o teto seja alcançado, seriam acionados os mecanismos previstos no artigo 31 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Entre eles estão a proibição de novas operações de crédito — salvo para refinanciamento da dívida mobiliária — e a obrigação de adotar medidas de ajuste fiscal para reconduzir a dívida ao limite no prazo de três quadrimestres.
Oriovisto argumenta que o limite é uma forma de disciplinar as contas públicas e reforçar a confiança dos investidores. Para o relator, esse movimento pode até ajudar o Banco Central a reduzir juros. “Se o governo fizer superávit primário, ainda que de 0,5% do PIB, restaura a confiança e abre espaço para a queda da taxa de juros”, afirmou.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é contra a fixação de um teto para a dívida da União. Mesmo assim, o relator sustenta que a iniciativa cabe exclusivamente ao Senado, conforme determina a Constituição. “Ninguém pode ter o poder de dever o infinito. Administrar é administrar recursos escassos. Precisamos cumprir a Constituição”, disse Oriovisto.
O projeto também prevê que a dívida bruta — excluídos estados, municípios e compromissadas — não ultrapasse 6,5 vezes a receita corrente líquida da União acumulada em 12 meses. Não há previsão de prazo de adaptação para o governo. O parecer deve ser apresentado até o dia 30 na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) ou, no máximo, em 15 dias.
O presidente da CAE e autor da proposta, senador Renan Calheiros (MDB-AL), defende celeridade. “Isso não é uma escolha. É um mandamento constitucional que nunca foi regulamentado. Vamos levar adiante”, afirmou. Já o vice-líder do governo, Rogério Carvalho (PT-SE), deve solicitar audiências públicas para ampliar o debate.
Economistas se dividem sobre a proposta. Para Felipe Salto, da Warren Investimentos, o limite pode ser positivo se bem desenhado. Ele defende que operações compromissadas sejam excluídas do cálculo e que o Tesouro mantenha seu colchão de liquidez. “É necessário prever ainda um período de waiver, em que a dívida possa crescer antes de estabilizar”, disse.
Já Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, vê riscos políticos. Para ele, a regra pode fragilizar a política monetária, ao permitir pressão sobre o BC quando a dívida se aproximar do limite, e gerar barganhas entre Legislativo e Executivo em pedidos de flexibilização. “A dívida cresce porque se aprovam gastos e benefícios fiscais. O teto não resolve isso, logo a regra não é crível”, avaliou.
A expectativa do relator é que o projeto seja aprovado ainda neste ano. Como se trata de resolução do Senado, a proposta precisa apenas da aprovação da Casa Alta para entrar em vigor — sem passar pela Câmara dos Deputados nem por sanção presidencial. O desfecho promete tensionar ainda mais a relação entre o governo e o Congresso em torno da condução da política fiscal.