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Exceções fiscais do governo Lula preocupam TCU e podem elevar dívida

Técnicos do TCU apontam que exclusões do arcabouço fiscal reduzem transparência, fragilizam metas e comprometem o controle da dívida brasileira

O Tribunal de Contas da União (TCU) emitiu um alerta ao governo Lula de que a prática recorrente de retirar despesas do cálculo das metas fiscais contraria os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e ameaça a transparência das contas públicas. De acordo com a análise conduzida sob relatoria do ministro Benjamin Zymler, só nos dois primeiros anos de vigência do novo arcabouço fiscal, cerca de R$ 89,9 bilhões foram excluídos do resultado primário, em seis medidas aprovadas nos exercícios de 2024 e 2025.

O relatório técnico ressalta que “constantes desconsiderações de despesas ou renúncias de receitas para fins de cumprimento da meta de resultado primário contrariam os princípios de responsabilidade fiscal”. Em 2024, foram retirados R$ 29 bilhões para o socorro ao Rio Grande do Sul após as enchentes, R$ 1,4 bilhão em ações contra incêndios na Amazônia e R$ 1,3 bilhão em restituição de despesas ao Judiciário. Já em 2025, foram excluídos R$ 45,3 bilhões em precatórios, R$ 3,3 bilhões para ressarcir aposentados do INSS vítimas de fraude e R$ 9,5 bilhões destinados a apoiar empresas afetadas pelo tarifaço americano.

Na semana passada, o plenário do TCU decidiu que o governo federal deve perseguir o centro da meta fiscal — e não apenas o piso do intervalo de tolerância — ao decidir sobre bloqueios de despesas. A decisão pode obrigar o Executivo a congelar até R$ 34 bilhões adicionais em pleno ano eleitoral. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, contestou a interpretação do TCU, argumentando que ela contraria a regra aprovada pelo Congresso. Apesar disso, reiterou o compromisso da equipe econômica em atingir os objetivos fiscais. O Ministério do Planejamento preferiu não comentar.

Para os técnicos do Tribunal, o problema é que o governo tem recorrido às exclusões mesmo quando a margem de tolerância do novo arcabouço seria suficiente para acomodar as despesas. Pelos cálculos, em 2024 seria possível absorver mais de 90% dos gastos dentro da banda e, em 2025, mais da metade, sem descumprir as metas. A prática, no entanto, foi adotar exceções integrais, o que enfraquece a confiabilidade do resultado primário como instrumento de política fiscal.

O documento enfatiza que essa perda de credibilidade compromete a capacidade do governo de ancorar expectativas sobre a dívida pública. Na prática, o país pode ser forçado a pagar juros mais altos para rolar seu passivo. “Os agentes econômicos deixam de acreditar que a meta fiscal estabelecida na LDO é um bom guia para o resultado efetivo, e o resultado primário vai aos poucos perdendo significado econômico, desconectando-se da realidade fiscal a cada nova exceção”, aponta o relatório.

O economista Tiago Sbardelotto, da XP Investimentos, reforça o diagnóstico. Para ele, o alerta do TCU é “oportuno” e mostra que as metas perderam a função original. “Já não servem mais como indicador de esforço, pois o mercado sabe que o déficit real será maior. Tanto é que o cumprimento das metas deixou de influenciar expectativas, e até o limite de despesas começa a perder força diante da proliferação de exceções”, disse.

Segundo o TCU, excluir gastos por meio de exceções é ainda pior do que alterar a meta oficialmente, porque gera dupla contabilidade: o resultado “legal” e o resultado efetivo. Essa prática, concluem os técnicos, compromete a transparência, fragiliza o arcabouço fiscal e coloca em risco a sustentabilidade da dívida pública brasileira.

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