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Estudo revela salto de 8.530% em ações de superendividamento desde 2021

A Lei do Superendividamento protege famílias vulneráveis, mas estudo mostra baixa efetividade e pressão sobre os tribunais

O superendividamento tem se consolidado como um problema estrutural nos lares brasileiros e também nos tribunais do país. Um estudo inédito da Predictus, empresa que atua com dados judiciais, mostra que o número de ações sobre o tema saltou de 409 em 2021 para 35.301 em 2024, um aumento impressionante de 8.530% após a entrada em vigor da Lei 14.181/2021, conhecida como Lei do Superendividamento.

A legislação foi criada para proteger consumidores endividados, estabelecendo regras tanto de prevenção quanto de renegociação de dívidas. Ela se aplica a débitos de consumo contraídos por pessoas físicas para uso pessoal, familiar ou doméstico, como cartão de crédito, cheque especial, crédito consignado, empréstimos pessoais e até financiamentos imobiliários. Segundo Hendrik Eichler, fundador da Predictus, a lei tem sido usada tanto por consumidores em situação de vulnerabilidade real quanto de forma estratégica por escritórios jurídicos especializados em renegociações.

Apesar do salto nos números, o levantamento mostra que a judicialização não tem resultado, na mesma proporção, em soluções práticas. Embora 46,8% dos processos tenham sido considerados procedentes, com reconhecimento judicial do superendividamento, apenas 14,3% resultaram na homologação de planos de pagamento que efetivamente reestruturam as dívidas. Isso significa que, em muitos casos, a decisão favorável não se traduz em renegociação concreta, servindo mais como mecanismo de pressão ou suspensão temporária das cobranças. Para o estudo, foram analisados 85.484 processos desde que a lei entrou em vigor.

A pesquisa também revela diferenças marcantes entre faixas de renda. Pessoas com ganhos de até R$ 1 mil mensais obtiveram 60,5% de procedência nos pedidos, enquanto aquelas com rendimentos superiores a R$ 20 mil tiveram apenas 47% de reconhecimento judicial. A disparidade regional é outro fator relevante: no Rio Grande do Sul, 57,7% dos processos resultam em decisões favoráveis, enquanto em Santa Catarina a taxa cai para apenas 26,9%, evidenciando insegurança jurídica no tratamento do tema.

Do ponto de vista setorial, o sistema financeiro é o principal alvo das ações. Bancos, financeiras e administradoras de cartões concentram 85% dos processos, o que representa 72.652 demandas. A instituição mais acionada acumula 9.564 processos — uma média de oito novos casos por dia útil desde 2021 — e as cinco maiores do setor reúnem entre 6.234 e 9.564 processos cada. Já os outros nove setores analisados, que incluem áreas como educação, comunicação, governo, construção civil, indústria e tecnologia da informação, respondem juntos por apenas 15% do total.

Eichler avalia que a lei trouxe avanços, como a proteção de famílias vulneráveis, o aumento da consciência jurídica e financeira e a geração de precedentes que fortalecem o direito do consumidor. No entanto, alerta para riscos como a baixa efetividade, o possível uso abusivo da lei como ferramenta estratégica de negociação e a sobrecarga no Judiciário. Para ele, os dados deixam claro que o superendividamento judicializado está diretamente ligado ao sistema financeiro nacional, que concentra a imensa maioria dos casos.

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