O anúncio das tarifas adicionais de 50% impostas pelos Estados Unidos sobre exportações brasileiras, oficializado nesta semana pelo presidente Donald Trump, trouxe preocupação imediata sobre o impacto nos preços internos. No entanto, análises recentes de consultorias e bancos mostram que o efeito sobre a inflação deve ser consideravelmente menor do que se imaginava no início. Isso se deve principalmente à lista de 694 produtos que ficaram isentos da taxação, entre eles itens estratégicos para a balança comercial do país, como petróleo, suco de laranja e aeronaves da Embraer.
Com base nas novas exceções, cálculos preliminares indicam um impacto benigno para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), em torno de 0,10 ponto percentual (p.p.). Antes da divulgação dessa lista, algumas projeções trabalhavam com efeito próximo de 0,20 p.p. A consultoria Quantitas, por exemplo, revisou suas estimativas após considerar que parte significativa da pauta exportadora brasileira não será afetada, reduzindo o potencial alívio sobre os preços domésticos para cerca de 0,1 p.p.
Apesar desse alívio, setores como o de proteína animal permanecem em atenção. A carne bovina é o produto mais relevante que continua sujeito à tarifa extra e tem peso de 2,8% no IPCA. Estudos da Buysidebrazil sugerem que, caso haja excesso de oferta interna com a redução das exportações para os EUA, os preços poderiam cair até 5%. Cenários semelhantes já foram observados em 2006, quando a febre aftosa derrubou os preços da carne em 5%, e em 2023, com uma queda de 9,4% após um caso atípico de vaca louca. No entanto, analistas ponderam que a forte demanda da China, que já compra mais da metade da carne exportada pelo Brasil, pode absorver parte desse excedente e reduzir o impacto sobre o mercado doméstico.
Outro produto afetado é o café, que possui peso de 0,7% no índice. Supersafras em anos anteriores mostraram que estoques elevados podem provocar quedas de 5% a 10% nos preços, como ocorreu em 2013, 2018 e 2019. Atualmente, os preços do café estão cerca de 30% acima da tendência histórica, o que abre espaço para recuos em caso de redirecionamento das exportações. Ainda assim, a presença de outros grandes compradores, como Alemanha e Japão, pode mitigar o impacto negativo no mercado interno.
O etanol, também com peso de 0,7% no IPCA, é outro item que continua sujeito às tarifas. De acordo com a Buysidebrazil, uma redução de 1% nos preços do combustível teria impacto direto de 0,01 p.p. no índice, podendo chegar a 0,03 p.p. se considerado o efeito indireto sobre a gasolina. Esse impacto, porém, é considerado marginal no quadro geral da inflação.
Economistas apontam que o efeito total das tarifas sobre o IPCA poderia chegar a -0,24 p.p., mas ressaltam que esse resultado dificilmente se materializará. Um dos motivos é a resistência observada nos últimos anos à queda do preço da arroba do boi, além da possibilidade de redirecionar exportações para outros mercados. Há ainda expectativa de que o governo americano amplie a lista de exceções, incluindo produtos como café e frutas tropicais, o que reduziria ainda mais qualquer impacto.
Embora o cenário pareça positivo para o consumidor no curto prazo, especialistas alertam para o efeito colateral dessa dinâmica. A queda de preços seria fruto da compressão de margens dos produtores e poderia reduzir investimentos e desestimular a produção, criando risco de repique inflacionário no médio prazo. Alexandre Maluf, economista da XP, ressalta que a oferta de frutas tropicais, por exemplo, poderia encolher caso os produtores deixem de ver viabilidade econômica após uma queda inicial de preços, anulando o efeito sobre o IPCA em poucos meses.
Com um contexto externo desafiador, marcado por tensões comerciais entre EUA e China e por medidas unilaterais de Trump contra parceiros estratégicos, o mercado segue atento à evolução do tarifaço e aos desdobramentos nas negociações diplomáticas do governo brasileiro. Apesar das exceções significativas já garantidas, carnes e café continuam no centro da preocupação por seu peso no índice de preços e na pauta de exportações.