O Banco do Brasil (BB) tenta virar a página após um dos períodos mais desafiadores de sua história recente. A alta inadimplência no agronegócio, setor historicamente relevante para a instituição, derrubou lucros, forçou revisões de metas e gerou preocupação entre investidores estrangeiros, que cobram sinais de recuperação.
Durante o Investor Day realizado em Nova York, a presidente do BB, Tarciana Medeiros, reconheceu que 2025 ainda será um ano de ajustes, mas projetou uma recuperação consistente a partir de 2026. “Será o ano em que vamos deixar alicerçada a retomada de crescimento para os próximos anos, para retomar o patamar do tamanho do Banco do Brasil”, afirmou em entrevista à Coluna.
O guidance atualizado do banco para 2025 prevê lucro líquido entre R$ 21 bilhões e R$ 25 bilhões, bem abaixo da projeção original de R$ 37 bilhões a R$ 41 bilhões. No primeiro semestre, o resultado foi de R$ 11,2 bilhões, uma queda superior a 40% ante o mesmo período de 2023.
Segundo Tarciana, a decisão de retirar o guidance anterior foi “difícil, mas necessária”. O principal fator para a deterioração dos resultados foi a explosão dos calotes no agronegócio, que levou o banco a registrar 808 casos de recuperação judicial no setor, somando R$ 5,4 bilhões em dívidas dentro de uma carteira de crédito rural de cerca de R$ 400 bilhões.
A presidente afirma que a Medida Provisória (MP) de renegociação das dívidas rurais deverá ter papel importante na reorganização financeira do setor. Metade dos R$ 12 bilhões liberados pelo Tesouro Nacional será destinada ao BB. Ainda assim, o impacto positivo deve ser gradual. “A provisão sobe de elevador e desce de escada”, diz Medeiros, ao lembrar que o banco precisou provisionar cerca de R$ 16 bilhões adicionais, o equivalente ao lucro de um trimestre.
Apesar do cenário adverso, o mercado começa a enxergar luz no fim do túnel. Em setembro, as ações do BB (BBAS3) subiram 8% na B3, impulsionadas pela expectativa de estabilização do crédito rural. O Citibank elevou a recomendação dos papéis de “neutra” para “compra”, citando a MP do governo como fator de alívio. Já o Goldman Sachs manteve posição neutra, destacando que o terceiro trimestre ainda será desafiador.
Os números confirmam a cautela. Segundo dados do Banco Central, o BB registrou lucro líquido de R$ 780 milhões em julho, abaixo dos R$ 976 milhões de junho. O Citi projeta que o banco poderá alcançar lucro de R$ 29,3 bilhões em 2026, o que representaria crescimento de 17,2% em relação à ponta alta do guidance atual e desempenho superior ao consenso de mercado.
Para reforçar a retomada, o BB aposta no segmento de alta renda, com o objetivo de ampliar em 25% a base de clientes. As marcas Estilo e Private passam por uma repaginação completa, e o banco pretende disputar espaço com concorrentes no atendimento premium. “Queremos ser o principal banco do cliente, mas sem a ilusão de exclusividade”, afirma Tarciana.
Outro ponto que preocupava investidores era o chamado “risco Magnitsky”, temor de sanções a bancos brasileiros em meio à política externa dos EUA. O encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump durante a Assembleia Geral da ONU foi visto como um sinal de distensão. “Cumprimos rigorosamente a legislação americana e brasileira, com suporte jurídico nos dois países”, garantiu Tarciana.
Mesmo com a melhora recente nas ações, o desafio do BB continua sendo reverter o impacto das perdas no agronegócio e reconstruir a confiança dos investidores. A recuperação virá, mas — como a própria presidente admite — “em ritmo de escada”.