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Diante da deterioração do cenário econômico, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deve acelerar o ritmo de alta de juros nesta quarta-feira (6), elevando a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, para 11,25% ao ano. Economistas consultados pela Folha consideram a medida essencial para trazer a inflação de volta à meta, especialmente frente ao agravamento do risco fiscal e à desvalorização do real.
A volatilidade do câmbio, impulsionada por incertezas no cenário internacional e pela ausência de um pacote fiscal definido pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), aumentou a inquietação dos mercados. Na última sexta-feira (1º), o dólar atingiu R$ 5,868, refletindo o cenário de incerteza em torno da votação presidencial nos Estados Unidos, com uma possível vitória de Donald Trump.
O Copom, em sua última reunião em setembro, projetou um dólar a R$ 5,60. Com a escalada recente da moeda americana, surgem pressões adicionais para a inflação, afastando ainda mais as expectativas do centro da meta de 3%, com tolerância de 1,5 ponto percentual.
Apreensão com o Cenário Fiscal e Expectativas Inflacionárias
Claudio Ferraz, economista-chefe para o Brasil do BTG Pactual, considera o cenário de política monetária "bastante desafiador", mencionando que a inflação está longe da meta há um longo período, em grande parte devido à incerteza fiscal. “Desde o ano passado, as preocupações com o cenário fiscal e o aumento das despesas são crescentes”, afirma Ferraz, enfatizando que um simples anúncio do governo sobre cortes de gastos não basta para tranquilizar o mercado; detalhes e a implementação concreta das medidas serão essenciais.
A situação fiscal continua preocupante, com a dívida bruta do país atingindo 78,5% do PIB em agosto, marcando o 14º mês consecutivo de alta. O governo estima que essa relação ultrapassará 81% do PIB em 2026, último ano do mandato de Lula, refletindo uma trajetória ascendente que, segundo economistas, compromete o controle da inflação.
Pressões sobre a Inflação de Alimentos e Serviços
Leonardo Costa, economista do ASA, destaca a inflação corrente de serviços como um dos principais motivos para o Copom adotar um ritmo de alta mais intenso. O aumento no preço dos alimentos, impulsionado pela depreciação cambial, é outro fator preocupante, com impacto direto no custo de vida das famílias.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) deve encerrar o ano em 4,55%, conforme apontado pelo boletim Focus, acima do teto da meta. Heron do Carmo, professor da FEA-USP, alerta que o índice pode se aproximar de 5% neste ano, pressionado pelo aumento nos preços da carne e pela base de comparação mais baixa em 2023.
Efeitos do Cenário Externo e a Questão Cambial
A possibilidade de uma vitória de Donald Trump nos Estados Unidos é outro ponto de preocupação para os economistas, já que sua agenda inflacionária pode retardar os cortes de juros pelo Federal Reserve (Fed) e fortalecer o dólar frente às moedas emergentes, como o real. Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital, observa que o contexto fiscal brasileiro aumenta a vulnerabilidade do país, elevando o prêmio de risco e dificultando a gestão econômica.
Nos últimos eventos em Washington, membros do Banco Central destacaram repetidamente que o risco fiscal eleva o prêmio de risco e, caso as contas públicas não sejam ajustadas, será inviável reduzir a Selic.
Mercado de Trabalho: pressão adicional sobre a inflação
Rafael Cardoso, economista-chefe do Daycoval, comenta sobre a "dupla face" do aquecido mercado de trabalho, com a taxa de desemprego em 6,4%, segundo dados do IBGE. Embora a renda maior dos trabalhadores estimule a demanda, também representa um custo para os empregadores, o que contribui para a inflação de serviços.
Diante deste cenário complexo, espera-se uma decisão unânime do Copom em favor da alta de 0,5 ponto percentual, com o objetivo de combater a inflação e estabilizar a economia. "É improvável uma divergência no colegiado neste momento, pois o consenso é essencial para manter a credibilidade da política monetária”, conclui Cardoso.