EUA quebram esquema bilionário de criptomoedas
Novas ferramentas ajudam autoridades federais estadunidenses a identificarem criminosos

Autoridades federais dos EUA perfuraram o véu das transações de blockchain. Agora, investigadores privados e governamentais podem identificar endereços de carteiras blockchain – série de letras e números usada ​​para enviar e receber criptomoedas anonimamente – associados a terroristas, traficantes de drogas, lavadores de dinheiro e criminosos cibernéticos.

Nos últimos dois anos, país apreendeu mais de US$ 10 bilhões em moeda digital, de acordo com a Receita Federal de lá. Trabalhando com “casas de câmbio” de criptomoedas e empresas de análise de blockchain, autoridades compilaram dados coletados de investigações anteriores para mapear o fluxo de transações desse tipo de moeda em redes criminosas mundo afora. Ou seja, acharam um jeito de seguir o dinheiro.

Caso Silk Road

James Zhong parecia ter cometido o crime perfeito. Em dezembro de 2012, ele se deparou com um bug de software ao sacar dinheiro de sua conta no Silk Road (“Rota da Seda”, em tradução livre), mercado online usado para ocultar negociações criminosas por meio do anonimato blindado (até então) das transações de blockchain e da dark web. Na época, Zhong, com 22 anos e cursando ciência da computação da Universidade da Geórgia, usava o site para comprar cocaína.

“Acidentalmente, cliquei duas vezes no botão de retirada e fiquei chocado ao descobrir que isso permitiu que eu sacasse o dobro da quantidade de bitcoin que havia depositado”, disse ele, anos depois, no tribunal federal. Após o primeiro saque fraudulento, Zhong criou outras contas e, com algumas horas de trabalho, roubou 50 mil bitcoins, que valiam, na época, US$ 600 mil (R$ 2,9 milhões, na cotação atual), segundo documentos judiciais de promotores federais.

Funcionários federais fecharam o Silk Road um ano depois, por motivos criminais, e apreenderam computadores que continham seus registros de transações. A princípio, os registros não revelaram a falcatrua de Zhong, porque autoridades ainda não sabiam como rastrear pessoas e grupos escondidos atrás de endereços de carteira blockchain.

Zhong transferiu bitcoins roubados de uma conta para outra por oito anos para cobrir seus rastros. No final de 2021, a alta do mercado de criptomoedas tinha aumentado o valor de seu tesouro para US$ 3,4 bilhões (R$ 16,7 bilhões). Mas, em novembro, agentes federais surpreenderam Zhong com um mandado de busca e encontraram as chaves digitais de sua fortuna criptográfica escondidas num cofre no porão e uma lata de pipoca no banheiro. Zhong, que se declarou culpado de fraude eletrônica, deve ser sentenciado nesta sexta-feira (14) no tribunal federal de Nova York.

Investigações

Investigadores do governo exploram uma característica do bitcoin e de muitas outras moedas digitais: cada transação fica, para sempre, no livro-razão on-line do blockchain, aberto para qualquer um ver. Desde a falcatrua de Zhong, autoridades e empresas privadas compilaram o equivalente a um livro de endereços blockchain para ajudar Receita Federal, FBI e autoridades estaduais e locais que investigam crimes cibernéticos.

A empresa de análise de blockchain Chainalysis, com sede em Nova York, disse que mapeou mais de um bilhão de endereços de carteira, separando participações legítimas e questionáveis ​​e identificando trocas nas quais a criptomoeda é convertida em dinheiro. “Blockchain faz uma coisa muito bem: ele preserva as evidências”, disse Jonathan Levin, detetive pioneiro de criptomoedas e um dos fundadores da Chainalysis, em entrevista ao Wall Street Journal.

Agora, ao roubar bitcoins, é como se o criminoso tivesse afanado um banco na neve. É o que disse Matthew Price, ex-investigador da Receita Federal que agora conduz investigações para a Binance, espécie de casa de câmbio para criptomoedas. Price acrescentou que o nome do criminoso pode ser desconhecido, suas migalhas digitais são como pegadas na neve, que permanecem frescas para autoridades seguirem.

Para você ter uma ideia, investigadores federais usaram técnicas de rastreamento de blockchain para fechar um site de pornografia infantil, interromper financiamento de organizações terroristas recuperar US$ 3,6 bilhões (R$ 17,7 bilhões) de um casal de Nova York acusado de lavar lucros da Bitfinex, outra “casa de câmbio” de criptomoedas. Inclusive, essa foi a maior apreensão financeira já feita pelo Departamento de Justiça dos EUA. E, a cada caso, mais contas entram no catálogo de endereços blockchain do governo estadunidense.

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