Possível ida de Campos Neto ao Nubank gera desconforto no setor bancário
Fontes de três instituições financeiras afirmam que a gestão de Campos Neto no BC teria favorecido o Nubank em discussões regulatórias

A possível nomeação de Roberto Campos Neto, ex-presidente do Banco Central, para cargos de direção e conselho no Nubank causou incômodo nos bastidores do setor bancário. Embora ainda esteja cumprindo o período de quarentena, que termina em 1º de julho, Campos Neto afirmou que pretende assumir os cargos de diretor de Políticas Públicas, vice-chairman e membro do conselho da fintech tão logo esteja legalmente autorizado. A nomeação, no entanto, tem sido vista por executivos de bancos como um possível conflito de interesse.

Fontes de três instituições financeiras, incluindo dois grandes bancos e uma instituição de médio porte ouvidas pelo Estadão/Broadcast sob anonimato, afirmam que a gestão de Campos Neto no BC teria favorecido o Nubank em discussões regulatórias. Um deles alega que havia abertura desproporcional à fintech nas pautas do regulador, independentemente da atuação de entidades representativas do setor como a Febraban ou a Associação Brasileira de Bancos. Outro executivo classificou a condução da política do BC como uma “cruzada contra bancos tradicionais”.

A percepção se intensifica porque, embora existam outras fintechs de grande porte no Brasil, o Nubank é, de longe, a maior delas — e, portanto, o principal beneficiado pelas mudanças regulatórias implementadas nos últimos anos. Durante o mandato de Campos Neto, o BC lançou o Pix, ferramenta gratuita e instantânea de transferências que impulsionou o movimento de recursos dos grandes bancos para plataformas digitais.

Por outro lado, fontes próximas às fintechs argumentam que o Nubank também foi alvo de regulações mais rígidas sob sua gestão. Em 2022, o BC elevou a exigência de capital para instituições de pagamento, afetando diretamente o Nubank. A fintech, à época, estimou que a regra definitiva era de 10% a 15% mais rigorosa do que o previsto inicialmente. No mesmo ano, um novo teto foi imposto sobre tarifas de intercâmbio em cartões pré-pagos, o que representou um impacto de cerca de 2,9% em sua receita.

Legalmente, não há impedimento para que Campos Neto assuma cargos no setor privado após o período de quarentena. O próprio ex-presidente do BC defende a integridade da agenda que liderou e afirma que suas medidas buscaram "inclusão, competição e sustentabilidade" no sistema financeiro. “Milhões de brasileiros são beneficiados neste processo”, afirmou em resposta à reportagem.

Campos Neto também destacou que sua gestão tornou o Brasil uma referência global em inovação financeira e que os programas do BC seguem sendo executados com sucesso mesmo após sua saída.

A prática de ex-presidentes do Banco Central migrarem para o setor privado não é inédita. Armínio Fraga fundou a Gávea Investimentos após deixar o cargo. Ilan Goldfajn assumiu o conselho do Credit Suisse antes de ser indicado para cargos no FMI e no BID. Já Henrique Meirelles passou por empresas como J&F e Banco Original antes de retornar ao setor público como ministro da Fazenda no governo Michel Temer.

Apesar de não haver ilegalidade, a possível ida de Campos Neto ao Nubank reacende o debate sobre a relação entre reguladores e o setor que regulam. 

redacao
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