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A relação comercial entre Estados Unidos e China, construída ao longo de décadas, vive seu momento mais tenso, com uma escalada rápida de tarifas que ameaça romper de forma “monumental” o vínculo entre as duas maiores economias do mundo.
Em poucos dias, os dois países elevaram significativamente as tarifas sobre produtos um do outro, com os EUA chegando a aplicar 125% sobre importações chinesas e a China reagindo com 84% sobre bens americanos. A postura firme de ambos os lados sinaliza um impasse duradouro, com impactos potenciais sobre toda a economia global.
Essa disputa supera os confrontos tarifários do governo Trump em 2018-2019 e reflete uma mudança de fundo: os EUA temem sua dependência da China em setores estratégicos, enquanto Pequim busca liderar uma nova ordem global. A interrupção do fluxo comercial entre os países já afeta cadeias globais, e especialistas alertam que o mundo pode ter que escolher entre os dois blocos.
Os efeitos já são sentidos. Nos EUA, as tarifas devem aumentar a inflação, elevar o desemprego e desacelerar a economia — alguns analistas já falam em recessão.
A China, por sua vez, enfrenta dificuldades internas, como crise imobiliária, endividamento e alta taxa de desemprego juvenil, e vê a ruptura com seu principal parceiro comercial ameaçar ainda mais seu crescimento. O Goldman Sachs, inclusive, reduziu sua projeção de crescimento chinês de 4,5% para 4%.
Empresas de ambos os países já reagem. Fabricantes chineses buscam novos mercados para seus produtos — como os 6 milhões de veículos elétricos que planejam exportar em 2025, poucos deles para os EUA. Pequenos empresários americanos, como John K. Thomas, que depende da China para vender e fabricar seus produtos, estão perdendo acesso ao mercado chinês por conta das novas tarifas. “Com 84%, estamos completamente fora”, lamenta ele.
O impacto no consumo americano também será grande: a maioria dos smartphones, notebooks, brinquedos e eletrônicos vendidos nos EUA vem da China. Com a alta das tarifas, os preços devem subir, pressionando o orçamento das famílias e reduzindo o poder de compra.
Para Pequim, a estratégia tem sido compensar a fragilidade interna com foco nas exportações. Mas com o fechamento de mercados, inclusive por receio de parceiros em relação ao excesso de produtos chineses, esse caminho também se mostra limitado. A tensão comercial, se mantida, pode reverberar em desaceleração global.
Diante desse cenário, especialistas alertam para uma ruptura que vai além do comércio: trata-se de um realinhamento geopolítico que pode fragmentar a economia mundial, alterar cadeias produtivas e forçar países e empresas a redefinir suas estratégias diante de um novo equilíbrio de forças. (Com The New York Times Company)