O pacote de medidas alternativas à elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) apresentado pelo governo federal gerou decepção entre economistas e representantes de setores econômicos. A principal crítica concentra-se na ausência de medidas efetivas de contenção de gastos públicos, mantendo o foco exclusivamente no aumento da arrecadação.
Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, considerou que o ajuste ocorre apenas na arrecadação, reduzindo parte das distorções do IOF sem conseguir compensar totalmente o problema. Para ele, a proposta de corte linear de 10% no gasto tributário demonstra que o governo não possui um plano consistente sobre as medidas fiscais necessárias. Vale prevê que, no segundo semestre, será necessária uma nova rodada de bloqueio e contingenciamento para atingir o déficit mínimo previsto para este ano.
O economista-chefe do Banco BMG, Flavio Serrano, avaliou que o governo recuou diante da pressão sobre o risco sacado e optou por propor aumentos de impostos. Segundo ele, o país mantém o mesmo problema fiscal de sempre, com gastos crescentes sem nenhum ajuste estrutural nessa dinâmica.
As estimativas iniciais indicam um potencial arrecadatório de até 30 bilhões de reais em 2026. A XP Investimentos calcula que as medidas podem gerar 26 bilhões de reais, montante insuficiente para compensar totalmente o recuo no IOF. Desse total, 17,4 bilhões de reais viriam do corte linear de 10% nas despesas tributárias, entre 5 bilhões e 6 bilhões do fim da isenção de produtos de renda fixa como LCAs e LCIs, outros 2,5 bilhões de reais da elevação da alíquota sobre empresas de apostas online, além de mudanças marginais na tributação das fintechs.
A Warren Investimentos projetou arrecadação líquida de 30 bilhões de reais, incluindo 2 bilhões com o aumento do imposto sobre Juros sobre Capital Próprio (JCP) e 1,83 bilhão com a elevação da Contribuição Social sobre Lucro Líquido. Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, resumiu que o governo simplesmente trocou o IOF por outros impostos.
Andrea Bastos Damico, da Buysidebrazil, expressou frustração com o anúncio, destacando que as expectativas incluíam temas como ajustes no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e desvinculação do mínimo constitucional da saúde e educação, medidas que não foram contempladas no pacote.
Rai Chicoli, economista-chefe da Citrino Gestão de Recursos, reconheceu mérito nas propostas ao reduzir parcialmente as distorções do IOF original, embora não ataquem o problema principal. Para ele, taxar LCI e LCA reduz distorções no mercado de renda fixa, e elevar a tributação das casas de apostas é defensável devido às externalidades negativas. Contudo, alertou que majorar a CSLL pode desincentivar fintechs, prejudicando a competição no setor.
O setor de jogos e apostas reagiu negativamente através da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), que enviou documento ao Congresso criticando a proposta de elevar a tributação. A entidade argumenta que o aumento não produzirá efeitos significativos em 2025 e pode levar ao crescimento de plataformas clandestinas e disputas jurídicas.
A proposta de maior impacto arrecadatório, o corte linear em despesas tributárias, é vista com ceticismo. Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, considera a medida de difícil implementação devido à legislação específica de cada benefício, podendo gerar judicialização massiva. Segundo ele, o governo não possui conhecimento adequado sobre quem usufrui dos benefícios e quanto já foi utilizado, perpetuando um modelo onde se gasta primeiro para depois procurar como fechar as contas.
O setor imobiliário manifestou preocupação com o fim da isenção do LCI, que afetará diretamente o financiamento habitacional. Entidades do setor alertam que a medida aumentará em 0,5% o valor da taxa de financiamento do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo.
Ana Claudia Utumi, tributarista e sócia do Utumi Advogados, alertou que mesmo com a redução das medidas relativas ao IOF, a possibilidade de judicialização permanece aberta. Ela destacou dúvidas sobre a tributação de 5% do Imposto de Renda para letras de investimento, questionando se a medida abrangerá apenas investimentos isentos ou também aqueles com alíquota zero.
Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, interpreta o anúncio como sinal de que uma reforma fiscal mais ampla ocorrerá apenas após a eleição presidencial. Para ela, ao propor medidas com impacto principalmente em 2026, o governo demonstra que a preocupação com o cumprimento do arcabouço fiscal não estava focada em 2025.
Manoel Pires, coordenador do Observatório Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre), destaca que muitas propostas, se aprovadas, terão que observar noventenas ou o princípio da anualidade, concentrando a arrecadação mais em 2026 do que em 2025. Segundo ele, o governo enfrenta dois problemas básicos: a receita esperada que não se realizará este ano e o agravamento da situação em 2026, quando a meta fiscal aumenta de déficit zero para superávit de 0,25% do PIB.
Josué Pellegrini, economista da Warren Investimentos e ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), criticou a restrição das medidas às receitas, sem propostas concretas para os gastos. Embora as medidas possam ajudar a resolver as contas de 2025, ele considera que o cenário permanece complicado para 2026.
Murilo Viana, da GO Associados, não se mostrou surpreso com as medidas, que evidenciam a pouca disposição governamental para ajustar despesas. Ele destacou que o governo apresentou principalmente intenções, focando na construção de uma solução no Congresso, onde a agenda de corte de benefícios fiscais tem encontrado dificuldades.
Carla Beni, professora de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), considerou a alternativa ao IOF interessante por ter sido construída em harmonia entre Executivo e Legislativo. Contudo, ela observou que ficaram de lado possibilidades de mudanças estruturais mais profundas, como ajustes no Fundo Eleitoral, nas emendas parlamentares e nos supersalários públicos.