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Não há dúvidas de que a Inteligência Artificial (IA) generativa é uma inovação extremamente disruptiva que trará tanto a destruição como a melhoria de empregos. O equilíbrio entre os dois é agora um tema quente em que a gestão de ativos cada vez mais se encontra servindo, embora involuntariamente, como um “experimento natural”.
A maneira como a revolução da IA generativa está sendo implementada no setor lança uma luz não só sobre a discussão sobre emprego, como também sobre questões organizacionais e regulatórias mais amplas que impactarão o resto das finanças, a saúde e muito mais.
Um dos aspectos mais marcantes da revolução da IA generativa é que ela está apenas começando. Seus principais condutores – o poder computacional, os dados, os talentos e os financiamentos – estão se combinando em uma escala e velocidade que acentuarão suas forças disruptivas. Não admira que ela tenha chegado ao topo da agenda dos executivos-chefes em um número cada vez maior de empresas e setores.
A gestão de ativos é um dos setores em que a IA generativa oferece grandes promessas, apontando para uma série de mudanças na forma como a indústria opera e está organizada. Ela já está sendo usada pelas companhias mais ágeis para melhorar a eficiência operacional, a comunicação, e para protegê-las melhor contra ataques cibernéticos. E isso é apenas o começo.
Tanto as equipes de investimentos quanto as de atendimento ao cliente podem agora preparar apresentações em Power Point com incrível facilidade para transmitir capacidades e justificar novas ideias comerciais. A comunicação dos retornos e atribuição de desempenho aos clientes, uma obrigação crítica e demorada, é feita de forma mais rápida e precisa. E as equipes técnicas têm mais ferramentas à disposição para combater o número crescente de tentativas de hacking.
Em cada um desses casos, a IA generativa está reforçando o trabalho. Ela aumenta o que os funcionários podem fazer, ajudando-os a subir na curva de valor agregado. Embora vá haver perda de postos de trabalho em tarefas rotineiras e que exigem baixa qualificação, o impacto geral sobre o trabalho será positivo, especialmente à medida que mais engenheiros forem sendo contratados. Saber como falar com os motores da IA torna-se uma habilidade essencial tanto para os novos funcionários como para grande parte dos já existentes.
Agora, olhe para frente. Não é difícil vislumbrar um mundo em que os motores da IA generativa serão uma parte integral de todas as tarefas de maior qualificação de alocação de ativos, modelos de portfólios, seleção de títulos e redução de riscos. Esses motores serão treinados sobre enormes conjuntos de dados existentes no setor e que hoje são brutalmente subexplorados.
Dados os avanços tecnológicos, também não é difícil imaginar ferramentas de IA generativa ajudando a criar e estruturar novas classes de ativos, treinadas nesse caso por uma combinação de dados reais e virtuais. Com o tempo, as partes mais dinâmicas e bem-sucedidas da gestão de ativos irão combinar ferramentas habilitadas pela IA generativa com novas capacidades que, mais importante, são nativas da própria IA generativa. Com isso vem a capacidade de personalizar de uma maneira muito mais refinada as contas de investimentos individuais para atender a tolerância ao risco dos clientes e suas inclinações comportamentais.
No entanto, o caminho a seguir também será acidentado. As capacidades existentes estão longe de serem perfeitas e o talento não está distribuído uniformemente. A sua aplicação está sujeita a vieses. Ainda não há boas respostas para quem irá policiar internamente a IA e que conjunto mais amplo de regulamentações nacionais e, possivelmente, internacionais vai governá-la. E a crescente fragmentação da tecnologia entre a China e os EUA, um fenômeno que vai apenas aumentar, está deixando desconfortáveis aqueles que vivem entre os dois.
Este é também um caminho que verá grandes perturbações na estrutura do setor. Aqueles que não compreenderem o poder disruptivo da IA e suas possíveis aplicações – especialmente a bem do talento, da agilidade de gestão e organização de dados – terão cada vez mais dificuldade em acompanhar. A disparidade aumentará ainda mais se eles não conseguirem tirar partido das oportunidades de grandes saltos que provavelmente só estarão disponíveis no começo.
No seu conjunto, essa dinâmica impulsionará ainda mais as tendências do setor no sentido de uma estrutura de um punhado de firmas muito grandes e um número maior de concorrentes de nicho bem menores. Os gestores de médio porte, aqueles com ativos de US$ 100 bilhões a US$ 500 bilhões, e as firmas atrasadas na adoção da IA generativa serão pressionados a se consolidar ou simplesmente atrofiarão. É aqui que ocorre a destruição de empregos.
O que a gestão de ativos enfrenta irá se repetir de diferentes maneiras em outros lugares, incluindo o resto dos setores de finanças e saúde. É um fenômeno que as firmas só podem ignorar por sua conta e risco. É também uma medida que irá pressionar as autoridades reguladoras que, tendo se concentrado demais nos bancos, já estão atrasadas em seu entendimento e supervisão das instituições não bancárias.
Mohamed El-Erian, Financial Times