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Os fundos de private equity, que são aqueles que compram participação acionária em empresas, estão vivendo um dos períodos de maior desafio dos últimos anos. O cenário é provocado pela volatilidade e pelo fato de que o mercado de aberturas de capital está travado há quase três anos, tornando mais estreitas as portas para saída de investimentos. As incertezas econômicas, de outro lado, também deixaram mais complexos novos aportes. Mesmo assim, o relato é de mais movimento no setor, algo que deve se refletir nos números mais à frente.
No ano até a primeira semana de maio, a venda de ativos por gestoras que atuam no Brasil somou US$ 105 milhões e os investimentos, ou seja, desembolsos para adquirir participações em empresas, US$ 997 milhões. Segundo dados da Dealogic, trata-se do pior início de ano, em ambas as pontas, desde 2020, quando a eclosão da pandemia fechou os mercados.
Para se ter uma ideia, a queda foi relevante em relação a 2023, cujo início de ano foi marcado pela revelação da fraude contábil da varejista Americanas, que fechou de forma abrupta e simultaneamente os mercados de renda variável e de renda fixa, de forma inédita. Em termos de novos investimentos, no comparativo anual, houve uma queda de 8%. Em saídas, o recuo foi ainda mais intenso, de cerca de 80%, na mesma base de comparação.
O início difícil de 2024 ocorre depois de dois anos também fracos para a atividade desses fundos em todo o mundo, com as taxas de juros mais altas prejudicando o financiamento das aquisições, mas também tornando mais estreita a porta de saída de investimentos via mercado de capitais. No entanto, com muitos fundos ainda capitalizados e com recursos em caixa, vem crescendo a pressão pelos desembolsos para retorno aos cotistas.
Dentre os investimentos realizados em 2024, o americano Advent se manteve ativo e comprou a empresa de cosméticos Skala, por valores que não foram divulgados. Ainda aportou R$ 1 bilhão, ao lado do canadense CPPIB, na rede de educação básica Inspira. A Atmos, Warburg Pincus e Mission investiram no grupo Salta. Entre os ativos que buscam comprador no momento estão, por exemplo, a Odontocompany, pela LCatterton, e o Gran Coffee, pelo Pátria, ambos já com assessores financeiros contratados. Já dentre os desinvestimentos realizados, o Pátria vendeu ações da Hidrovias do Brasil para a Ultrapar nesse intervalo.
Conforme dados da Abvcap, associação que reúne os fundos de private equity que atuam no Brasil e usa uma base mais ampla do que a da Dealogic, os investimentos no primeiro trimestre chegaram a R$ 5 bilhões, ante R$ 9 bilhões no quarto trimestre e de R$ 5,8 bilhões no mesmo intervalo de 2023.
Presidente da Abvcap, Priscila Rodrigues aponta que o objetivo do setor é “colocar o dinheiro para trabalhar” e que tem observado os fundos com capital em caixa olhando para oportunidades. Quem começar a investir antes, lembra, poderá conseguir preços mais atrativos. “O que atrapalha os desinvestimentos é o que beneficia alocação”, diz Rodrigues, que também é uma das principais sócias da gestora de private equity Crescera.
Piero Minardi, da gestora Warburg Pincus, prevê um 2024 ligeiramente melhor para os fundos, dado o grau de incerteza da economia. Por outro lado, a leitura dele é que os fundos têm investimentos já maduros em suas carteiras e que, por isso, haverá desinvestimentos, muito embora a janela de ofertas iniciais de ações (IPO, na sigla em inglês) siga fechada. “Se os fundos carregam esses investimentos por mais um ano começa a se diluir a taxa interna de retorno”, frisa o executivo.
"Estamos vendo um movimento sustentável e os fundos têm um ‘dry powder’ [caixa para investir] relevante, afirmou Anderson Brito.
Apesar de os números do início do ano demonstrarem menor atividade no período, os private equity estão mais ativos nas mesas de negociação e vão começar a investir, avalia o sócio do escritório Madrona Fialho, Ricardo Madrona. “Desde março, abril, esses fundos estão mais ativos para começarem a alocar”, afirma. O fechamento dessas transações que começaram a ser trabalhadas nos últimos meses, contudo, aparecerão nos números apenas mais à frente.
Para exemplificar, comenta Madrona, dos 15 mandatos de M&A (fusões e aquisições, pela sigla em inglês) que estão em sua mesa, seis são de fundos. Outros quatro mandatos de private equity, conta, estão sendo negociados neste momento.
O diretor do UBS BB Anderson Brito afirma que no banco o pipeline de transações vindas de private equity é bastante relevante no momento, incluindo operações do “buy side”, ou seja, na qual eles estão na ponta compradora. “Estamos vendo um movimento sustentável e os fundos têm um ‘dry powder’ [caixa para investir] relevante”, afirma o executivo. Ele aponta que, apesar do cenário de mais desafios, os fundos estão conseguindo captar. “Vemos isso de forma positiva e em um ambiente de incertezas é um dos melhores momentos para apostar nessa classe de ativos”, destaca o executivo. “Além disso, com o mercado de capitais fechado há menos competição”, lembra.
Brito também afirma, por outro lado, que as negociações estão levando mais tempo para ser concluídas e, por isso, o movimento ainda não está refletido nos números de transações deste ano.
Pedro Muzzi, diretor do Goldman Sachs no Brasil, afirma que as conversas de M&A estão mais ativas neste momento e que os fundos de private equity terão posição de destaque nessa retomada. “Os private equities fazem parte desse ecossistema e estarão presentes tanto na entrada quanto na saída”, diz.
Na igc Partners, que foi o assessor da empresa do setor de cosméticos Skala na venda ao Advent, os fundos de private equity seguem entre os competidores pelos ativos, mas com uma maior presença dos estrangeiros, ao passo que os locais estão mais afastados, segundo Daniel Milanez, sócio da igc. “Os fundos gringos não têm problemas com ‘dry powder’ ”, comenta o executivo. A leitura, segundo Milanez, é de que a partir do próximo ano, com a melhoria das condições econômicas, fundos locais voltem a ocupar um espaço maior do lado comprador.
(Valor Econômico)