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Apesar da resistência dos bancos, segue em discussão no governo a possibilidade de estabelecer um teto para os juros no novo formato de crédito consignado destinado a trabalhadores do setor privado. A proposta de reformulação da modalidade e o fim do saque-aniversário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) devem ser enviadas ao Congresso em novembro, conforme apurado pelo Estadão/Broadcast.
O novo modelo do consignado, que atende trabalhadores com carteira assinada por meio de descontos diretos no salário, é visto pelo Executivo como uma alternativa ao saque-aniversário, que foi introduzido em 2019 e, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), poderia comprometer a sustentabilidade do FGTS.
Embora seja difícil igualar as baixas taxas de juros do saque-aniversário, que giram em torno de 1,79% ao mês, o governo acredita que as garantias e a concorrência no novo modelo de crédito consignado devem tornar as taxas mais competitivas. Mesmo assim, técnicos do MTE defendem a implementação de um limite de juros para evitar "abusos", uma vez que o saldo do FGTS será utilizado como garantia nas operações.
Nos bastidores, há debates sobre a melhor forma de aplicar esse teto de juros. Uma ideia é não incluir a taxa no texto do projeto de lei, mas deixar a definição para a regulamentação, que também poderia estabelecer prazos máximos para as operações, embora essa abordagem seja vista como complexa.
Para atender à solicitação dos bancos, o governo planeja implementar um período de transição entre a entrada em vigor do novo crédito consignado e a extinção do saque-aniversário. Essa possibilidade foi antecipada em abril pelo ministro do Trabalho, Luiz Marinho, em entrevista ao Estadão/Broadcast.
Mudanças no saque-aniversário e garantias do novo consignado
Atualmente, o saque-aniversário permite que o trabalhador retire de 5% a 50% do saldo de sua conta do FGTS. A proposta de transição ainda não foi definida, mas uma das ideias é adotar uma transição linear, com uma única alíquota aplicada por um período específico, a ser definido em lei.
Para tornar o novo consignado mais atrativo, algumas mudanças já estão previstas. Hoje, o trabalhador pode oferecer até 10% do saldo de sua conta vinculada ao FGTS como garantia para o empréstimo. A proposta em estudo visa aumentar esse limite, embora o novo percentual ainda não tenha sido divulgado. Já a margem consignável, que permite que o trabalhador comprometa até 35% de seu salário com empréstimos, deve ser mantida no novo modelo.
Outra mudança significativa é a eliminação da necessidade de intermediação da empresa empregadora. A contratação do crédito ocorrerá por meio de um leilão reverso no eSocial, onde, ao manifestar interesse, o trabalhador receberá propostas dos bancos, podendo escolher a que mais lhe convier. O governo também pretende abrir a oferta do produto para bancos digitais, visando aumentar a concorrência no setor.
Meta: alcançar 40% dos trabalhadores com carteira assinada
Com essas mudanças, o governo espera que, de forma conservadora, o novo modelo de crédito consignado alcance até 40% dos trabalhadores com carteira assinada, equivalente à parcela que atualmente recorre ao consignado do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Ao todo, o potencial de abrangência do programa é de até 40 milhões de trabalhadores. Hoje, cerca de 15 milhões já utilizam a alienação do saque-aniversário, comprometendo parte de seus recursos do FGTS com operações de crédito.
Em uma entrevista recente ao Estadão/Broadcast, Marcos Pinto, secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, destacou que o novo modelo do consignado é uma aposta para reduzir o spread bancário. Ele ressaltou que o uso do eSocial permitirá que, mesmo se desligado, o trabalhador possa manter sua dívida ativa, transferindo-a para um novo emprego. “Tudo isso reduz muito o risco do empréstimo para o trabalhador e reduz muito o custo de crédito, diminuindo também as taxas”, afirmou.