O Senado aprovou nesta quarta-feira, em votação simbólica, o projeto de decreto legislativo que anula o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), anunciado pelo governo Lula em maio. A proposta, que já havia passado pela Câmara dos Deputados, não precisa da sanção presidencial e será promulgada diretamente, uma vez aprovada pelas duas Casas do Congresso. A decisão representa uma derrota para o governo federal, que esperava contar com os recursos gerados pela medida para reforçar o caixa da União.
A iniciativa de colocar a proposta em pauta partiu do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), em uma movimentação de última hora na noite anterior. A votação pegou de surpresa tanto o Palácio do Planalto quanto lideranças do Congresso, inclusive o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que se reuniu com Motta na manhã desta quarta-feira para tratar do tema. A expectativa do Ministério da Fazenda era arrecadar cerca de R$ 10 bilhões com a majoração do imposto.
A reversão de um decreto presidencial pelo Congresso é rara. Desde 1989, menos de 1% dos projetos de decreto legislativo apresentados na Câmara com o objetivo de suspender atos do Executivo foram aprovados. Mesmo assim, o projeto de urgência para anular o aumento do IOF teve tramitação acelerada após ser aprovado na semana passada com ampla maioria: 346 votos a favor e 97 contrários.
Durante as negociações, o governo buscou ganhar tempo com a proximidade das festas juninas — período de recesso informal dos parlamentares — e o pagamento de emendas. A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, tentou articular uma saída negociada com líderes da base e do governo, mas os esforços não foram suficientes. A votação surpresa desta quarta-feira frustrou os planos do Planalto, que esperava usar as próximas semanas para reduzir a tensão com o Congresso.
Nas redes sociais, Gleisi lamentou a decisão e destacou as possíveis consequências fiscais. Segundo ela, a revogação do decreto poderá comprometer a meta fiscal de 2026 em até R$ 30 bilhões. A ministra ainda alertou que programas sociais como Auxílio Gás, Minha Casa Minha Vida, Assistência Social e Pé de Meia podem ser afetados por conta de um contingenciamento maior, que poderá chegar a R$ 41 bilhões neste ano — frente aos R$ 31 bilhões já previstos.
Gleisi também afirmou que a derrubada do aumento do IOF comprometerá o repasse de emendas parlamentares. De acordo com seus cálculos, o contingenciamento adicional será de R$ 2,7 bilhões em 2025, totalizando R$ 9,8 bilhões. Para 2026, as perdas estimadas nas emendas chegariam a R$ 7,1 bilhões.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também se manifestou publicamente, afirmando que a medida do Executivo visava corrigir distorções tributárias e garantir justiça fiscal. “O decreto do IOF corrige uma injustiça: combate a evasão de impostos dos mais ricos para equilibrar as contas públicas e garantir os direitos sociais dos trabalhadores”, escreveu Haddad nas redes sociais.
Por sua vez, o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), criticou a decisão do Congresso, alegando que a medida coloca em risco programas sociais cruciais. “Não queremos cortar recursos para valer o ‘acabou’, não queremos tirar dinheiro do Minha Casa Minha Vida, do Bolsa Família”, declarou.
A votação desta quarta marca mais um capítulo de atrito entre o Executivo e o Legislativo, em um momento delicado para a gestão fiscal do governo. Além da anulação do decreto do IOF, o Planalto ainda enfrenta resistência do Congresso a outras medidas arrecadatórias, como a regulamentação dos supersalários e o aumento da carga tributária em setores específicos.