Views
Consolidando a trajetória de recuperação iniciada em abril, o turismo brasileiro deve terminar o ano com crescimento de 16% e faturamento de R$ 151 bilhões – 22% inferior ao registrado no período pré-pandemia. Os dados são do levantamento do Conselho de Turismo (CT) da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
O setor, que foi fortemente impactado pelas restrições da crise sanitária, enfrentou dois períodos distintos em 2021.
O primeiro, com a segunda onda da pandemia de covid-19 (que prejudicou ainda mais as atividades), no primeiro semestre; e o segundo (com a retomada possibilitada pelo avanço da vacinação), na última metade do ano.
A partir de abril, as variações passaram a ser positivas (36%), embora seja necessário considerar que a base de comparação – o segundo trimestre de 2020 – é bastante frágil em razão do contexto de restrições às atividades econômicas vivenciado no período.
Os segmentos que registraram os resultados mais expressivos, a partir do quarto mês do ano, foram os de transporte aéreo e serviços de alojamento e alimentação, com altas anuais de 83,9% e 61,9%, respectivamente.
No entanto, mais uma vez, a base de comparação explica o resultado, pois, esses foram os setores que mais sofreram o impacto da crise em 2020, estando, também, ainda abaixo do patamar de abril de 2019.
A demanda dos passageiros aéreos, que até junho estava menor que 5 milhões de pessoas, atingiu nível superior a 6 milhões em julho, mantendo-se no mesmo patamar nos meses seguintes.
Agora, a perspectiva é que o transporte aéreo encerre o ano com faturamento de R$ 37,8 bilhões (crescimento anual de 30,5%), porém, ainda 36% abaixo do nível de 2019. Já o resultado projetado do último trimestre deve ser 12% menor em relação ao mesmo período do ano pré-pandemia.
O grupo de alimentação e alojamento deve registrar alta de 15,9%, com faturamento de R$ 25 bilhões. Na comparação com 2019, o quadro ainda é negativo (26%).
Assim como acontece no transporte aéreo, no entanto, pode haver uma aceleração da recuperação na última parte do ano. No caso do transporte rodoviário (intermunicipal, interestadual e internacional), que apresentou quedas relativamente modestas no início do ano, deve encerrar 2021 com alta de 9% e faturamento de R$ 17,7 bilhões (5,1% abaixo do patamar de 2019).
Já para o grupo de locação de veículos, agência e operadoras de turismo, a expectativa é que haja um aumento no faturamento de 4,2%, chegando a um faturamento de R$ 29 bilhões. Entretanto, em comparação a 2019, o nível ainda é 8,5% abaixo.
Embora negativo, é um dos resultados relativos mais favoráveis entre os setores analisados pelo levantamento. O último trimestre deve registrar um ritmo de crescimento de 7%, sinalizando uma importante recuperação para 2022.
Para as atividades culturais, recreativas e esportivas (que, no primeiro semestre, sofreram queda de 7,4%), a projeção para a segunda metade do ano é de aumento de 11,7%, encerrando 2021 com alta de 1,9%.
Como este grupo depende, essencialmente, do número de pessoas completamente imunizadas, com o ritmo de vacinação bem estabelecido, a tendência é que haja cada vez mais aumento de público e atividades no próximo ano, dando condições para uma recuperação mais robusta. Por fim, para o transporte aquaviário, a projeção de alta é de 8,4% (R$ 467 milhões em valores absolutos).
Impacto da inflação no turismo
Apesar de os números apontarem para um bom desempenho no início de 2022, o processo inflacionário, que impacta tantos as famílias como as empresas, pode limitar um crescimento mais expressivo do setor no próximo ano, embora o dólar alto ainda mantenha a atratividade do turismo doméstico, que passou a ser “descoberto” por muitos brasileiros.
A presidente do CT da FecomercioSP, Mariana Aldrigui, avalia que a pressão da inflação no orçamento das famílias é (e seguirá sendo) o fator mais importante a ser observado no próximo ano (especialmente a partir de março, quando a demanda começa a diminuir).
“Infelizmente, como em outros momentos relevantes para o turismo, fez-se muito pouco em termos de investimentos, oferta de crédito e estímulo à inovação, o que deixa o Brasil ainda mais dependente de seu mercado interno”, analisa.
O levantamento, com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que o setor tem enfrentado inflação de 16,75% nos últimos 12 meses. Esta variação é superior à média do Índice de Preços do Consumidor Amplo (IPCA), de 10,67%. Isto é, há um avanço real de preços do turismo de 5,49%.
As passagens aéreas são as principais responsáveis pela alta. Em 12 meses, o preço delas aumentou 50,11%, resultado da demanda reprimida pela pandemia e do aumento de custos, sobretudo do querosene (QAV), que subiu 90%, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
A alta dos insumos (combustível e energia elétrica) também deve impactar outras atividades importantes do setor, como hotéis e translados, que repassarão os custos aos consumidores e aos pacotes turísticos, pressionando os valores nos próximos meses. Com a falta de alguns produtos, como o chip semicondutor, que está atrasando o processo produtivo de várias montadoras pelo mundo, alugar um veículo ficou, em média, 19,94% mais caro em relação a 2020.
Embora algumas atividades ainda não repassem a inflação para o preço final (caso da hospedagem, que teve aumento médio de preços de 4,44%), como o processo inflacionário atual é estrutural, o ajuste é questão de tempo e deve continuar, pelo menos, até metade do próximo ano.
“O resultado não surpreende, uma vez que já se previa um aumento considerável da demanda, que esteve reprimida ao longo dos últimos 18 meses. Os aumentos generalizados nos insumos de todos os setores também colaboram com a elevação dos preços, e é provável que a curva de aumento siga ascendente nos próximos meses (pelo menos até o carnaval), podendo ser revertida somente em caso de queda acentuada na demanda”, avalia Mariana Aldrigui.