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Empresas que atuam em áreas relevantes para a infraestrutura do país poderão em breve captar recursos no mercado por meio de um novo instrumento de dívida com benefícios fiscais. Foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Lei 14.801, que cria as debêntures de infraestrutura. Diferentemente das debêntures incentivadas, que estão no mercado desde 2011, esses papéis darão benefícios tributários às companhias emissoras e não aos investidores.
As empresas que tiverem esse tipo de dívida poderão deduzir da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) 30% do valor que foi pago em juros aos investidores.
A expectativa no mercado é que o benefício dado às empresas se traduza no pagamento de remunerações maiores nos títulos, ou seja, que ocorra uma “compensação” do benefício fiscal na forma de um rendimento maior aos investidores.
“Se isso ocorrer, as debêntures de infraestrutura poderão atrair bolsos diferentes, como o de fundos de pensão que já têm benefícios tributários e não enxergam muitas vantagens em títulos incentivados que apresentam taxas mais baixas”, diz Ricardo Russo, chefe da área de infraestrutura do Pinheiro Neto Advogados.
Outra possibilidade é que as debêntures de infraestrutura comecem a atrair também os estrangeiros. A lei prevê, mediante regulamentação do Poder Executivo, que as operações possam ter uma cláusula de variação cambial, ou seja, que o título seja emitido no mercado brasileiro, mas com o valor atualizado conforme a variação do dólar.
“Isso pode ser interessante pela possibilidade de proteção da moeda tanto para a emissora que possui contratos de fornecimento em dólares quanto para os investidores estrangeiros”, diz Miriam Signor, sócia da área de desenvolvimento e financiamento de projetos do Lefosse.
Entre os advogados ouvidos pelo Valor, há dúvidas se o benefício fiscal poderia ser estendido também aos títulos emitidos por empresas no exterior, os chamados “bonds”. Essa questão, assim como outros detalhes das debêntures incentivadas, deve ser esclarecida em um decreto aguardado para os próximos 30 dias. Nele, deve constar, por exemplo, quais setores da economia são prioridade na oferta das debêntures e quais tipos de projetos são elegíveis.
Conforme o texto da lei sancionada, os recursos captados com os títulos devem ser usados para “implementação de projetos de investimento na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação”.
Uma mudança relevante que a lei traz, segundo Signor, é que deixará de ser necessário uma aprovação ministerial prévia para os projetos atrelados às debêntures. Até agora, para emitir um título incentivado era necessário um enquadramento do projeto pelo ministério competente. Se uma empresa de energia, por exemplo, quisesse emitir uma dívida atrelada a um projeto de ampliação da linha de transmissão, deveria buscar o aval do Ministério de Minas e Energia. No caso das debêntures de infraestrutura, essa etapa deixa de existir, o que deve tornar o processo para a oferta mais rápido.
“Muito embora isso não fosse um gargalo, a mudança facilita as emissões”, diz a advogada.
As debêntures de infraestrutura devem concorrer, de certa forma, com as debêntures incentivadas, que ganharam espaço nos últimos anos em meio ao aumento dos juros no país. De janeiro a outubro de 2023, as emissões desses títulos somaram R$ 51,5 bilhões, conforme dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). O valor supera o movimentado em 2022, que foi de pouco mais de R$ 40,7 bilhões.
Sobre uma eventual diminuição de ofertas das incentivadas a partir de agora, Marinis Pigossi, sócia do Cepeda Advogados, diz acreditar que isso não deve ocorrer. “As duas são complementares e vão permitir às empresas focar em investidores diferentes. É um produto a mais que o mercado vai ter, o que é algo muito benéfico”, afirma.
O que deve fazer uma companhia escolher entre emitir um ou outro tipo de debênture com benefício fiscal será, entre outros pontos, qual público ela pretende atingir.
Se o objetivo for alcançar o bolso do investidor pessoa física, as incentivadas devem ser as favoritas, já que garantem a isenção do Imposto de Renda para esses agentes. Se os investidores pessoa física comprarem debêntures de infraestrutura, terão que pagar o mesmo que em outros produtos de renda fixa, com a alíquota podendo variar entre 22,5% e 15%, dependendo do período da aplicação.
(Valor Econômico)