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Após o escândalo envolvendo a 123milhas, que deixou uma grande quantidade de consumidores sem a possibilidade de viajar devido ao calote nas passagens compradas, a Câmara dos Deputados está avançando com um projeto de lei para regulamentar os programas de fidelidade e o uso de milhas aéreas. O texto mais recente propõe uma série de medidas, incluindo a proibição de cobrança de taxas adicionais pelas empresas, a garantia de que os "pontos" acumulados sejam considerados ativos imprescritíveis, sem prazo de validade, e a autorização para venda para terceiros, bem como a transferência para herdeiros.
A iniciativa adquiriu caráter de urgência durante a última sessão legislativa do ano, em dezembro, e sua possível aprovação tem gerado preocupação entre as empresas do setor com a retomada das atividades na Câmara. Em comunicado, a Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (Abemf) defendeu a autorregulação do setor, solicitou um debate mais aprofundado sobre o projeto de lei e argumentou que algumas das propostas podem até mesmo inviabilizar os programas de fidelidade.
O deputado Jorge Braz (Republicanos-RJ) apresentou um relatório sobre quatro projetos de lei que tratam da regulamentação das milhas aéreas, incluindo o da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras com Criptoativos, que investigou o caso da 123milhas e recomendou o indiciamento de seus proprietários.
Como forma de evitar situações semelhantes ao ocorrido com os clientes da 123milhas, o deputado também determinou que a venda ou transferência dos pontos acumulados não pode ser realizada com a promessa de entrega futura do serviço. O comprador deve receber o benefício imediatamente. A agência de viagens em questão vendia passagens mais baratas a longo prazo, porém os clientes só recebiam os bilhetes alguns dias antes da data de embarque (conhecida como "tarifa flexível").
Uma nova versão do projeto será protocolada na próxima semana com o intuito de estender essa regra a todos os programas de fidelidade do país, incluindo aqueles oferecidos por postos de gasolina, supermercados, varejistas e instituições bancárias. "Recebi representantes das empresas aéreas e uma das críticas feitas, com razão, foi que apenas os programas delas seriam afetados. Seria injusto. Por isso, vamos propor um novo parecer abrangendo todos os programas de fidelidade", afirmou o deputado.
O parlamentar defende as mudanças com o argumento de que as milhas/pontos se tornaram um serviço à parte como, por exemplo, os clubes de milhagem em que se recebe o benefício sem necessariamente utilizar o serviço, mediante uma assinatura mensal.
“Essas benesses, entre aspas, são ativos, são dinheiro. E, portanto, devem ser imprescritíveis, inclusive podendo passar como herança para algum beneficiário designado pelo proprietário em caso de morte”, afirma Jorge Braz.
As empresas criticam as mudanças propostas. Para a Abemf, o assunto precisa de “ampla e profunda” discussão para “garantir os direitos e deveres das empresas e consumidores e poder proporcionar condições favoráveis ao desenvolvimento do setor e regras equilibradas”. “Entendemos que a criação de eventuais regras para o setor deve levar em consideração as suas características e especificidades. Caso contrário, corre-se o risco de limitar uma indústria em franco crescimento e desenvolvimento, que vem contribuindo para a geração de empregos, movimentação da economia nacional e arrecadação fiscal”, disse.
O requerimento de urgência foi aprovado na última sessão do ano com 318 votos a favor e apenas 21 contra. O Novo foi o único partido a se opor, com o argumento de que se tratam de relações privadas. O PL chegou a esboçar reação também, mas mudou de ideia após o relator permitir a venda das milhas para terceiros. “Agora que esse obstáculo foi retirado, a gente entende que o projeto é benéfico e que visa a sanar problemas como o que a população está sofrendo”, disse a deputada Bia Kicis (PL-DF).
A proposta de Braz faz mudanças substanciais nos atuais programas:
- acaba com o prazo para vencimento das milhas;
- permite que os clientes as vendam;
- proíbe taxas adicionais para compra de passagem com milhas ou transferência delas para outras pessoas;
- exige seis meses para que alterações no regulamento das empresa entrem em vigor.