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O acordo nos Estados Unidos (EUA) sobre a dívida do país, embora caminhe para encerrar o imbróglio que agitava os mercados há semanas, pode aumentar os efeitos de desaceleração na economia.
A principal preocupação entre economistas diz respeito às restrições de gastos do governo, firmadas entre o governo Joe Biden e o Congresso no fim de semana. O texto está em conversas finais e deve ser votado a qualquer momento.
O governo atingiu em janeiro o teto da dívida do país, de mais de US$ 31 trilhões (mais de 120% do PIB), e precisava de um acordo que autorizasse gastos acima desse limite.
Assim, foi acordada uma suspensão dos limites da dívida até 2025. Em contrapartida, o governo se comprometeu a manter o gasto público estável nos próximos dois anos e aumentá-lo em apenas 1% em 2025.
A projeção da gestora Kínitro Capital é que o acordo, nesses termos, gere impulso fiscal negativo da ordem de -0,4% do PIB americano em 2024.
“Ou seja, o impulso fiscal trabalhará para um crescimento menor do PIB ao longo do próximo ano. Esse fator impactará negativamente o crescimento em 2024”, diz Sávio Barbosa, economista-chefe da Kínitro.
Em abril, a estimativa do Fundo Monetário Internacional para a economia americana era de crescimento de 1,6% em 2023 e de 1,1% em 2024. O resultado representaria uma desaceleração frente aos 2,1% de 2022, mas ainda não uma recessão, isto é, uma queda do PIB.
No entanto, a preocupação ocorre porque, nos últimos trimestres, os gastos do governo tiveram efeito importante no crescimento dos Estados Unidos, o que tende a ser reduzido a partir de agora.
Como agravante, há o fato de que os riscos de recessão já estavam no radar diante do aperto monetário promovido pelo banco central americano, o Fed.
Para conter a inflação recorde em 2022, o Fed promoveu 10 altas consecutivas na taxa de juros. O patamar atual (com juros entre 5% e 5,25%) é o maior desde agosto de 2007. O desafio do banco central do país será garantir o chamado “pouso suave”, uma desinflação via alta de juros, mas sem levar o país à recessão.
Risco global
Apesar das dúvidas sobre o efeito no crescimento, o acordo para a dívida americana era muito aguardado nos últimos dias. Sem isso, o governo poderia chegar a junho com o chamado shutdown — sem dinheiro para continuar operando.
A incerteza fez as bolsas em Nova York caírem por vários dias na semana passada e colocou a nota de crédito dos EUA sob “observação” pela agência de risco Fitch. O cenário levou a quedas também na bolsa brasileira.
O último shutdown havia sido em 2019, no governo Donald Trump, e durou 35 dias. As confusōes políticas em torno da dívida americana costumam acontecer sobretudo quando o Congresso é controlado pela oposição ao presidente, o que aumenta a demora nas negociações.
“O problema nos Estados Unidos não é o tamanho da dívida, porque há confiança na capacidade pagadora”, diz Adriano Cantreva, sócio da Portofino Multi Family Office e responsável pelo escritório da gestora em Nova York. “Mas chegar a uma solução ajuda a reduzir o risco globalmente.”
Para o Brasil, redução do risco é positiva, mas recessão preocupa
O acordo, assim, é benéfico para moedas de países emergentes, como o Brasil. Com o risco global elevado por um shutdown americano, moedas como o real poderiam ficar enfraquecidas.
Por outro lado, os efeitos recessivos tendem a causar impacto negativo na economia global, afetando também a atividade econômica brasileira.
“A restrição de gastos no governo americano tem impacto recessivo, e pode ser que o crescimento mundial se reduza um pouco por causa disso”, diz a coordenadora de conjuntura da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Julia Braga.
“E temos ainda os impactos do aumento da taxa de juros do Fed, que não terminou o ciclo de aperto. Há expectativa de que terminará em breve, mas ainda é incerto. Isso tudo torna o cenário internacional mais desafiador.”