O valor das cotas do Pátria Special Opportunities II caíram de R$ 10,5 para -R$ 301

Imagine realizar um aporte em um fundo de investimento e acordar no outro dia com o saldo negativo. Foi isso o que aconteceu com os cotistas do fundo Pátria Special Opportunities II, gerido pelo Pátria Investimentos, uma companhia com US$ 27,3 bilhões sob gestão em produtos de investimentos em private equity, infraestrutura, real estate e crédito.

Por meio de um fato relevante publicado na segunda-feira (24), o Pátria informou ao mercado que realizou um reajuste no valor das cotas do fundo, que passaram de R$ 10,5 para surpreendentes -R$ 301. O ajuste reflete o desinvestimento integral da Portfolio Centro Sul S.A., companhia anteriormente investida pelo fundo, informou a gestora.

Especialistas explicam que somente com base no fato relevante não é possível cravar o que aconteceu para tamanha desvalorização das cotas. Mas é possível especular – especialmente tendo em vista que não é a primeira vez que algo semelhante acontece em um fundo do Pátria. Em 2020, Pátria Special Opportunities I também foi reajustado e as cotas caíram 99,7%, de R$ 1 mil para R$ 4,00.

“Não temos muitas informações do Pátria Special Opportunities II e seus investimentos”, diz Felipe Paletta, analista e sócio da Monett. “Mas olhando esse fato relevante podemos concluir que houve algum evento na marcação do valor dos ativos em que o fundo investia, a holding Portfolio Centro Sul, que ou estavam ali superestimados ou suas dívidas foram subestimadas”.

O valuation de uma empresa é uma opinião fundamentada em dados financeiros, e pode variar de acordo com o avaliador do ativo. O que pode ter acontecido com o Pátria Special Oportunities II é que a gestora estava avaliando a Portfolio Centro Sul em um valor superior àquele em que o ativo é negociado no mercado. Assim, ao fazer o desinvestimento, acabou levando um prejuízo.

“Um exemplo: compram um ativo por R$ 100 e contratam uma empresa para fazer um laudo de valuation, que diz que o valor justo é R$ 150. Então estava cotado lá essa possibilidade de lucro de 50%. Depois, eles desinvestem e o valor recebido é R$ 80. Daí vem o prejuízo”, explica Felipe Pontes, sócio da L4 Capital.

Em meados de junho, um relatório do JP Morgan obtido pelo Brazil Journal já chamava a atenção para a forma como o Pátria avaliava os investimentos de seus fundos a múltiplos superiores aos de empresas semelhantes listadas.

O documento trazia alguns exemplos. O mais “chocante”, segundo o JP Morgan, era a Athena Saúde, que no fundo V da Pátria estava avaliada em US$ 1,8 bilhão para um EBITDA de US$ 12 milhões em 2022. Tal valuation seria equivalente a um múltiplo EV/EBTIDA de 159 vezes e um price to book de 5,5 vezes.

A Hapvida (HAPV3), uma empresa do setor de saúde listada na B3, era negociada na ocasião a 16 vezes Ebitda e a um price to book de 0,6 vezes.

“Ainda que a gente note que algumas empresas ainda possam estar em estágios de atingir os ganhos operacionais e de escala após o investimento de private equity, os prêmios de valuation significativos e generalizados atribuídos a todas as empresas chamaram nossa atenção,” escreveu o analista Domingos Falavina, à época no JP Morgan.

Em nota, o Pátria Investimentos informou que a transação da holding Portfólio Centro-Sul e de seus 4 shopping centers, localizados em Taubaté (SP), Lages (SC), Varginha (MG) e Bragança Paulista (SP), foi realizada na modalidade “porteira fechada”. E que os fundos de investimento envolvidos na operação tiveram suas cotas impactadas “em decorrência dos custos envolvidos na transação, os quais inclusive demandaram aporte na companhia para viabilizar a operação”, disse a gestora.

O que muda para o investidor

Para investidores que têm cotas do fundo Pátria Special Opportunities II na carteira, a notícia não é positiva. O regulamento do fundo, disponível no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) traz o seguinte trecho:

“12.5.1. Na medida em que o Administrador e o Gestor identifiquem necessidades de recursos para (i) a realização de investimentos nos termos deste Regulamento, ou (ii) o pagamento de Encargos ou manutenção de caixa para o pagamento de tais despesas, tudo nos termos dos Compromissos de Investimento e/ou deste Regulamento; ou (iii) a cobertura das chamadas não atendidas pelos Cotistas Inadimplentes, os Cotistas serão chamados a aportar recursos no Fundo, mediante a integralização das Cotas que tenham sido subscritas por cada um dos Cotistas nos termos dos Compromissos de Investimento (o valor que venha a ser efetivamente entregue, pelos Cotistas, ao Fundo, a título de integralização de suas Cotas, é doravante designado de “Capital Integralizado”).”

A princípio, o trecho indica que caberia aos cotistas arcarem com o prejuízo do fundo, diz Felipe Pontes, sócio do L4 Capital. “Pelo regulamento, a responsabilidade é dos cotistas, depois eles até podem entrar com um processo contra o fundo ou a gestora. Mas se um investidor tem mil cotas de R$ -300, ele vai ter que aportar R$ 300 mil.”

Se a necessidade de aportes for confirmada, o Pátria deverá encaminhar uma notificação por escrito a cada um dos cotistas, com antecedência, solicitando a integralização parcial ou total dos saldos.

O prejuízo nas cotas somado à possibilidade de serem cobrados para novos aportes já está fazendo alguns investidores procurarem o Instituto Empresa, uma associação civil que defende os direitos dos minoritários.

O Instituto confirmou que está examinando a questão e a possibilidade de abertura de um processo na arbitragem contra o Pátria a partir dos regulamentos envolvidos. “Note que como se tratava de um FIP, os ativos não estavam sujeitos a oscilações exógenas como preço do petróleo, efeito de guerra, mas de decisões diretas do Gestor. Isso pode gerar rompimento de deveres fiduciários e, portanto, dever do gestor indenizar”, afirma.

E-Investidor

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