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O Brasil ou a administração brasileira da usina de Itaipu Binacional terá de abrir mão de pelo menos US$ 415 milhões (R$ 2,5 bilhões) em 2025 para manter a tarifa da usina no mesmo patamar de 2024, conforme o acordo firmado entre Brasil e Paraguai para evitar aumentos na conta de luz de 130 milhões de consumidores brasileiros que utilizam a energia da hidrelétrica.
De acordo com cálculos realizados pela TR Soluções, a pedido do Valor, essa quantia é necessária para cobrir o custo da tarifa de Itaipu. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, assegurou em 2024 que os consumidores brasileiros não seriam impactados por aumentos tarifários, prometendo um reembolso de US$ 300 milhões anuais ao longo de três anos, deduzidos do orçamento de investimentos brasileiros em Itaipu. Esse valor cobre a diferença entre o custo tarifário atual de US$ 19,28 por kW e o valor anterior de US$ 16,71 por kW.
O orçamento de Itaipu para 2024 é de US$ 2,17 bilhões, sendo metade destinada a cada país. Contudo, os consumidores brasileiros arcam com 80,5% desse valor devido ao contrato de energia excedente do Paraguai, conforme definido pelo tratado da usina.
Risco de insuficiência financeira
A tarifa de Itaipu para as concessionárias é composta pela Cuse (custo unitário dos serviços de eletricidade), a cessão de energia excedente e o saldo da conta de comercialização. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) identificou um déficit na conta brasileira de comercialização, prorrogando a tarifa de 2024 até março de 2025 e exigindo uma solução para o déficit em até 45 dias.
Helder Sousa, diretor de regulação da TR Soluções, estima que a diferença necessária para cobrir os custos da operação é de US$ 3,63 por kW, totalizando os US$ 415 milhões anuais. A ENBPar (Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional), responsável pelos contratos de Itaipu, declarou que há previsão orçamentária para cobrir US$ 295 milhões, mas faltam cerca de US$ 120 milhões.
Sousa sugere ajustes no decreto 11.027/2022, permitindo que o superávit da conta de comercialização seja utilizado para cobrir o déficit antes da distribuição de bônus.
Impactos e críticas
Estudos adicionais da Academia Nacional de Engenharia (ANE) e da Frente Nacional dos Consumidores indicam que o déficit pode ser ainda maior, alcançando US$ 670 milhões anuais, dos quais 80,5% seriam pagos por consumidores brasileiros. Isso eleva a responsabilidade do Brasil para cerca de US$ 540 milhões anuais, tornando o reembolso prometido pelo governo insuficiente.
O presidente da Frente Nacional dos Consumidores, Luis Barata, criticou a gestão do acordo:
"Este buraco é mais um detalhe da grande trapalhada que o ministro fez com a tarifa de Itaipu. Isso é um escândalo. Alertamos o presidente Lula sobre a necessidade de reduzir drasticamente a tarifa de Itaipu, já que ela impacta os consumidores mais pobres do Sul, Sudeste e Centro-Oeste."
Soluções sugeridas
Para o ex-diretor da Aneel, Jerson Kelman, a solução é transferir recursos do lado brasileiro de Itaipu, atualmente depositados na Caixa Econômica Federal, para a conta de comercialização da ENBPar. Ele também propõe eliminar algumas ações socioambientais patrocinadas pela usina, consideradas fora de seu mandato.
"O inadmissível seria aumentar ainda mais a conta de luz dos consumidores brasileiros," afirmou Kelman.
O Ministério de Minas e Energia confirmou que Itaipu promove aportes na Conta de Comercialização para manter a tarifa em US$ 17,66 por kW/mês entre 2024 e 2026, conforme acordos celebrados. Contudo, com poucos ajustes aparentes no horizonte, o cenário segue desafiador, e o impacto sobre os consumidores continua gerando preocupação e críticas.