BC mostra que 29,5 milhões sacaram R$ 279 bi; R$ 201 bi foram para outros ativos

Diversos indicadores já apontavam que os investidores vinham saindo da poupança nos últimos anos e migrando para outros instrumentos mais atrativos, como os depósitos a prazo (CDBs), letras de crédito imobiliário (LCI) e do agronegócio (LCA). Agora, uma pesquisa do Banco Central (BC) reforça essa teoria e traz mais dados. Os números indicam que não foi o poupador de baixa renda que saiu da poupança, mas aqueles com volumes maiores investidos.


O BC realizou um estudo sobre a redução no saldo da poupança em 2022 e concluiu que essa queda se deve, principalmente, a uma “pequena parcela de sacadores” que retiraram valores da caderneta para investir em outros produtos, como LCA, CDBs e LCI. A pesquisa analisou 57 milhões de pessoas dos cinco maiores bancos do país - Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Santander - com saldo de pelo menos R$ 500 na poupança. Dentro deste recorte, 29,5 milhões de indivíduos sacaram quase R$ 279 bilhões e aportaram R$ 201 bilhões em outros ativos.

O estudo mostra que os grandes sacadores são as pessoas de maior renda. Apenas 1 milhão de indivíduos (4% dos que fizeram saques) retiraram cerca de R$ 146 bilhões da caderneta, correspondendo a mais da metade do volume total resgatado. Quando se pega os 16% dos maiores sacadores, eles retiraram quase 80% do total que saiu da poupança.

Esses 16% de maiores sacadores têm renda mediana anual acima de R$ 47,5 mil (R$ 3,9 mil por mês) e aplicaram cerca de R$ 116 bilhões em outros ativos financeiros. Os principais destinos foram CDBs (R$ 37 bilhões), LCAs (R$ 34 bilhões) e LCIs (R$ 17 bilhões). A pesquisa ainda destacou participações em certificados de recebíveis imobiliário (CRIs) e letras imobiliárias garantidas (LIGs).

O saldo da poupança está em queda desde 2021, depois de alcançar o nível do R$ 1 trilhão durante a pandemia. Em dezembro de 2022, o estoque chegou a R$ 998,9 bilhões. No último mês de 2023, estava em R$ 983 bilhões e, em março deste ano, atingiu R$ 975,8 bilhões.

Este mês, um levantamento do Valor com dados de Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa já tinha mostrado que em 2023, pela primeira vez, a poupança foi ultrapassada pelas letras (LCI, LCA, letras financeiras, entre outras) como fonte de funding para as instituições. Os CDBs também cresceram fortemente e superam poupança, letras e bônus externos combinados.

Desde que o rendimento da poupança foi alterado, em 2012, os CDBs vêm ganhando força, movimento que foi reforçado a partir de 2018 com a ascensão das plataformas de investimento, que passaram a distribuir títulos de terceiros, incluindo de bancos médios, que oferecem rendimentos mais atrativos.

No início do ano, dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) tinham mostrado que a poupança terminou 2023 com a menor participação da história na estrutura de fontes de recursos usados no crédito imobiliário. Em termos absolutos, o saldo das captações por meio de instrumentos de mercado de capitais (40%) ultrapassou, pela primeira vez, a tradicional caderneta (34%) na composição do funding.

O diretor de fiscalização do BC, Ailton de Aquino Santos, ressaltou na terça-feira que o estudo ainda demanda mais aprofundamento e pontuou que essa migração dos recursos da poupança vem se acentuando. “Há uma facilidade maior para deslocar os recursos, e também tem um outro fator que vem se apresentando que é o próprio uso do open finance. A capacidade de quando você compartilha seus dados e tem recursos na poupança, o outro banco que você compartilhou e oferece um produto de maior rentabilidade.”

A pesquisa também destaca outros fatores relevantes para a redução do saldo da poupança. Considerando os 16% maiores sacadores, cerca de R$ 106 bilhões não foram para os ativos financeiros mapeados. De acordo com a pesquisa, os recursos podem ter ido para consumo, pagamento de empréstimos, investimentos em ativos reais e aplicações em títulos públicos ou ações negociadas na bolsa. “A indisponibilidade de dados impossibilitou identificar a eventual alocação dos recursos em ativos reais e nesses tipos de aplicações financeiras”, diz o estudo.

De qualquer forma, a poupança perdeu espaço na carteira dos investidores de todas as faixas de renda. Naqueles 16% maiores sacadores, ela passou de 37% para 18% do portfólio total. Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) corroboram essa visão. Em março deste ano, os investidores de varejo tinham R$ 4,586 trilhões aplicados. Desse total, 16,7% estavam em fundos de investimento, 32,9% em títulos privados (incluindo CDBs, LCI e LCA), e 19,9% em poupança, entre outros. No private, que abarca os multimilionários, a fatia da poupança é infinitamente menor, de apenas 0,3% da carteira total.

O diretor de fiscalização ressaltou que a questão do funding para o sistema imobiliário vem sendo debatida constantemente no Comitê de Política Monetária (Copom) e no Comitê de Estabilidade Financeira (Comef) do Banco Central. Aquino também mencionou a medida provisória editada pelo governo na semana passada que permite que a Empresa Gestora de Ativos (Emgea) atue como securitizadora no mercado imobiliário. Para o diretor, essa é uma ação adicional e governo, BC e players do mercado estão atentos a esse tema.

“A securitização é sempre importante porque você abre espaço no balanço das instituições financeiras para poder conceder mais crédito”, afirmou.

(Valor Econômico)

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