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O espaço remanescente para reduções adicionais na Selic já se fechou, na avaliação de economistas de mercado que estiveram com diretores do Banco Central em reunião nesta segunda-feira. No momento em que as expectativas de inflação de médio prazo seguem em trajetória de alta, o portal Valor apurou que quase todos os analistas que estiveram presentes no primeiro encontro do dia disseram ver uma pausa no ciclo de flexibilização monetária, com a taxa básica de juros mantida em 10,5% a partir da reunião de junho do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC.
A primeira reunião do dia ocorreu entre 9h30 e 11h, no Rio de Janeiro, e contou com a presença dos diretores Diogo Guillen (política econômica) e Renato Dias Gomes (organização do sistema financeiro e resolução). E, nesse encontro, entre os economistas que expuseram seus cenários, quase todos avaliaram que o ciclo de ajuste na Selic chegou ao fim, com a taxa em 10,5%, e, entre os que avaliaram haver algum espaço para reduções adicionais, houve a ênfase de que esse espaço é pequeno, o que indicaria apenas um corte adicional de 0,25 ponto percentual no juro básico.
Os encontros ocorrem trimestralmente e são usados pela autoridade monetária para a confecção do Relatório de Inflação (RI), que será divulgado em junho. Nesse sentido, alguns participantes da reunião relataram alguma pressão por revisões nos modelos do BC para estimativas de juro neutro — o colegiado trabalha com uma taxa de 4,5% em termos reais — e de hiato do produto, que, nas contas do BC, tem indicado uma ociosidade maior na economia brasileira do que a estimada pelos agentes de mercado.
Os debates sobre a política monetária doméstica dominaram o encontro, assim como as discussões sobre a dinâmica futura das expectativas de inflação. De acordo com um dos presentes, o movimento adicional de desancoragem das expectativas foi visto como motivo de atenção pelos economistas e houve um debate sobre onde as projeções de inflação vão parar. “Duas pessoas disseram acreditar que as expectativas vão ficar próximas de 4% e algumas pessoas disseram colocar viés de alta para o IPCA do ano que vem, podendo revisar acima de 4%”, disse um dos presentes. O caráter benigno da inflação corrente também foi citado por alguns economistas.
Quanto ao cenário externo, que nas reuniões anteriores foi bastante comentado, o consenso entre os analistas que expuseram suas expectativas, aponta para dois cortes nos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano), enquanto o Banco Central Europeu (BCE) deve começar a reduzir as taxas em junho. Houve quem dissesse não ter convicção de que os juros americanos estão em território suficientemente contracionista. Além disso, alguns participantes teceram comentários sobre as eleições presidenciais nos Estados Unidos, com um dos analistas acreditando que o evento é inflacionário para o mundo via pressão nos preços de bens pela política fiscal expansionista e pelo efeito da desglobalização.
Além disso, o efeito das enchentes no Rio Grande do Sul no comportamento da atividade econômica, da inflação e da condução da política fiscal também foi debatido. Entre os economistas, esteve presente o receio de que a catástrofe no Sul do país possa ser usada para aumentar os gastos fiscais em ano eleitoral. Além disso, houve quem apontasse que a política fiscal se tornou “muito expansionista” diante da preocupação do governo com uma eventual desaceleração econômica, o que exige cautela ainda maior do BC na condução da política monetária.
Um dos presentes, inclusive, questionou quando o BC deve voltar a elevar os juros, ao ter em vista que as expectativas de inflação caminham para 4% e só devem ceder se houver sinais mais positivos quanto à condução das contas públicas à frente, ao avaliar que a desancoragem atual reflete a piora das expectativas fiscais e a composição futura do BC. Nesse sentido, de acordo com relatos obtidos, esse analista disse ter dúvidas sobre a nova função de reação da autoridade monetária, o que, para ele, impede uma queda das expectativas inflacionárias.